Roberto Rillo Bíscaro
Antigamente havia profusão de divas negras no mercado
corporativo norte-americano. Hoje, a maioria grava por selos independentes e as
poucas restantes sofrem grandes imposições das gravadoras. O mercado é dominado
por “brancas com vozes negras”, como Adele. Às negras com vozes negras resta se
promover mediante reality shows e
aproveitar o pouco espaço ainda existente fora do circuito indie. Esse é o panorama descrito por quem têm aberto a boca contra
essa situação, tipo Jazmine Sullivan e K. Michelle.
Esta última está de volta com o criativamente
intitulado More Issues Than Vogue (MITV). Como o antecessor Anybody Wanna Buy a Heart? (resenhado aqui), MITV é composto de R’n’B com produção contemporânea e
sem faixa dance. K Michelle é diva
dramática, não dançável. A treta com Drake ainda rende e os eu-líricos
realmente têm muitas questões, daí o trocadilho do título que aproveita 2
sentidos da palavra “issue”: edição e questão (no sentido de problema).
Em canções com arranjos discretos como Ain’t You e
Nightstand (pelo menos em boa parte dela), quem conduz a melodia é a poderosa
voz de Michelle, que destroça em baladaças dramáticas como These Men e All I Got.
Lentas arrasadoras não faltam, às vezes com pitadas de outros subgêneros, como
If it Ain’t Love e sua guitarra country. Em Make The Bed a influência é power pop de matriz africanizada comum
nos 80’s. Tem até corinho feminino de oh
oh oh no fundo.
Apesar de contemporâneo, o soul de K. Michelle sabe que pertence a tradição muito rica. A
abertura de Time parece Philly Soul e Not a Little Bit é sonho black: abre com
piano elétrico, segue como R’n’B bem atual pra dali a pouco entrar um coro
feminino com o refrão, saído da lavra celeste da época em que Diana Ross
duetava com Marvin Gaye, em You Are Everything. Pra apertar repeat, ajoelhar-se e ouvir olhando pro
céu.
Recheado com letras sobre relacionamentos, a exceção
fica por conta de Rich, R’n’B ostentação pra essa época onde tantos escondem
seu complexo de inferioridade projetando poder mais fingido que real. Pra
cantar dando muitos beijinhos nos ombros.
Álbuns como os de Vivian Green, Lizz Wright, Maysa Leak
- e hoje esta maravilha da K. Michelle - só provam a sacanagem de privar o
mundo de divulgação pra essas vozes
fenomenais. No que depender deste blog, divas negras sempre imperarão!
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