ORIGEM DO NOME DA BONECA EMÍLIA DE MONTEIRO LOBATO.
José Carlos Sebe Bom Meihy
Eis que de repente me reponta uma pergunta perturbadora: de
onde teria surgido o nome Emília, dado à boneca de pano feita pela Tia
Anastácia? Sim, falo daquela “coisinha” que foi feita com trapos velhos, olhos
de botão, brinquedo da menina Lúcia, no Sítio do Pica-Pau-Amarelo. Em pesquisa
a respeito do tema, notei que tal preocupação não me é exclusiva e que consta
também de curiosidade já expressa em provocativo site que aponta para algumas outras boas informações (http://www.recantodasletras.com.br/cronicas/443971).
De toda forma, sabe-se que essa questão é meramente especulativa, posto que em
muitos casos os nomes de personagens fictícios não correspondem às intenções pontuais,
previamente estabelecidas. Sei de ocorrências, inclusive, em que se nomeiam
personagens supondo efeitos sonoros, correspondências históricas, bíblicas,
mitológicas. Outros autores homenageiam familiares, amigos, personagens
ilustres e santos. Há também os que se vingam, delegando referências negativas
transparecidas em personagens maus, desafetos. No caso de Monteiro Lobato, algumas
sugestões desafiam entendimentos. Pensando em Emília, convém levar em conta sua
“genealogia espontânea”, considerando inclusive que originalmente ela foi
concebida como uma “bruxinha”, que aliás nasceu muda, sem graça, desconjuntada,
e que apenas começou a se expressar depois das famosas “pílulas falantes”,
criadas pelo Doutor Caramujo no Reino das Águas Claras. Esse caso, diga-se,
está registrado no livro A menina do
narizinho arrebitado, que, mais tarde, teve o título mudado para Reinações de Narizinho. Emília, depois
que começou a falar sem cessar – ela tagarelou por três horas seguidas, a ponto
de se pensar em fazê-la devolver a pílula ingerida – foi ganhando protagonismo,
a ponto de ser a figura central do Sítio.
Mas, quais alternativas teríamos então para entender o nome
daquela figura inquieta? A primeira que me ocorreu – sei de outras pessoas que
também sustentam tal possibilidade – foi derivada da evocação do mais prezado
livro do enciclopedista francês Jean Jacques Rousseau, escrito no século XVIII.
Significativamente intitulado Emílio, ou
da Educação, esse livro preside como um dos mais importantes libelos
redigidos sobre a necessidade da educação dos muito jovens. Nessa proposta narrada
como “romance de formação” é retraçada a trajetória de um menino educado,
modelo de condição civilizada. Rousseau, assim que se investiu do caráter
pedagógico como virtude, elegeu a “formação sistematizada” como mecanismo de
disciplina do ser humano, modo ideal de vivência em sociedade. É exatamente o
caráter educativo e a crença no livro como estratégia de neutralização entre as
pessoas e a sociedade, em particular no que tange à criança, que permite pensar
que a boneca Emília se espelharia em Emílio. Seria, é claro, uma figura
engraçada, suposta na linha de uma moderna pedagogia escolar. É lógico que cabe
distinguir as estripulias de Emília do comportamento assentado do Emílio rousseauniano.
De comum, no entanto, a noção pedagógica de aprender por meio de histórias.
Contra versões tão sofisticadas, não faltam aqueles que
preferem dizer que a designação Emília decorre do contato da boneca com seu
suposto biógrafo, o Visconde de Sabugosa que começou a escrever “As memórias de
Emília”. Lembremos que o fato dele ser uma espiga de milho poderia aproximar
Emília, de milho. Reforçando tal pressuposto, muitos advogam que ela possuía
cabelo parecido com os saídos das espigas, algo bem diverso das tiras de fitas
criadas recentemente por programas televisivos.
Na linhagem regional, existem alguns que defendem que Lobato
teria simpatias com Dona Ana Emília, representante de família ilustre de
Taubaté, os Oliveira Costa. Quantos fundamentam tal assertiva se apoiam
inclusive na existência de um sítio dessa família, nos arredores de Taubaté e
de lá teria advindo a inspiração, inclusive, para o Sítio do Pica-pau amarelo.
Sem dúvidas, sabe-se da profunda admiração que Lobato tinha
em relação ao educador baiano, Anísio Teixeira. Reza a lenda que a esposa do
importante personagem da educação brasileira, seria uma pessoa que falava
muito, alegre e sempre duvidando das coisas. Dona Emília, então, teria
inspirado Lobato que, assim, renderia homenagem a Anísio Teixeira. Alertando
que Lobato e Anísio Teixeira apenas teriam se conhecido nos Estados Unidos, a
pesquisadora Glaucia Bastos duvida desse vínculo.
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