segunda-feira, 2 de maio de 2016

CAIXA DE MÚSICA 216

Roberto Rillo Bíscaro

Desde Jean Michel Jarre, a França produz artistas eletrônicos bem legais, vide Rinocerose, Air e Daft Punk. Uma dessas gostosuras é o M83, que começou como duo em 2001, mas agora é concepção de Anthony Gonzalez mais músicos.
Dia 8 de abril, saiu Junk, viagem à memória emocional de fração dos anos 80. Gonzalez disse que o álbum foi baseado nas trilhas de seriados e sitcoms da década, como Punky – A Levada da Breca (exibido pela SBT), cujo letreiro está refletido nas letras componentes da capa de Junk. Gonzalez completou que as séries de hoje parecem todas iguais (papo de velho...). Cínicos contra-argumentarão que muito de Junk soa exatamente igual ao já exaustivamente produzido nos longínquos 80’s e que compensaria ouvir o original. Este resenhista, porém, adorou as 15 faixas, porque não há originais ou oriundos oitentistas suficientes pra saciar sua fome/sede pelo melhor decênio.
A agitada Do It, Try It abre com 2 pistas falsas:
a)       parece que será álbum dance, mas o material posterior é majoritariamente chill in.  
b)       O piano acid house com teclado synthpop e produção/elementos de moderna EDM levam a crer que Junk será orgia de referências 80’s resignificadas/ironizadas/problematizadas pra criar sonoridade própria, mas o material posterior é maciçamente revival apenas.
A seguinte Go também retrabalha elementos ao usar o onipresente sax – apelidei os 80’s de saxodécada – seguido de solo nervoso de guitarra em produção pop contemporânea. A partir daí, Junk soa mais como sessão saudade dos 80’s e faz isso muito bem.
A lindíssima Walkway Blues cruza George Michael com Hall & Oates e caberia num álbum do Capital Cities ou no White Women, do Chromeo.
Steve Strange, do Visage, já sabia que vocal falado em francês deixa as coisas mais chiques. Gonzalez – hoje radicado em Los Angeles -  bota uma moça falando sua língua nativa em Bibi the Dog, eletrofunk acasalado com eurodance com vocoder de groselha vitaminada Milanni (já que Junk é puro vintage, por que não esta ressenha?).
Ao ouvir a instrumental Moon Crystal passa pela cabeça a abertura duma sitcom imaginária de fins dos 70’s/início dos 80’s. O piano elétrico, o sax e o vocal feminino de For The Kids são elementos indispensáveis daquelas baladas que se tivessem existido nos 80’s poderiam hoje ser regravadas pela Rumer. O vocal infantil do fim arrancará lágrimas dos que se lembram dos 7 minutos de nobreza pop-brega fora dos EUA de Nikka Costa, em 1981.
As harmonias vocais de Atlantique Sud e Solitude deveriam relembrar muitos da contribuição que a produção de Alan Parsons pro Pink Floyd nos 70’s teve pra muito vocal oitentista. Além disso, Solitutde tem orgasmo de orquestração de sintetizador, super over, portanto, super 80’s.
Laser Gun tem letra levemente rappeada e vocal feminino Tom Tom Club com aquele timbre popularizado por Sister Sledge ou Love Unlimited. Road Blaster é Phil Collins fase But Seriously misturado com gritinhos High NRG e teclado early synthpop, como os usados pelo Metrô, em 84.
Os ventos do tempo de Time Wind levam a alguma rádio de 1985 ouvindo eletrofunk, mas com bateria eletrônica mais suave. Bateria eletrônica foi um erro pra boa parte da produção oitentista. Já que Junk desperta nostalgia pela Década, é impressão ou o piano do final remete à ítala I Like Chopin, do Gazebo?
Sunday Night, 1987 encerra Junk como se Enya ou Julee Cruise tivessem chamado Stevie Wonder pra tocar gaita em um de seus lançamentos daquele ano. De Djavan a Eurythmics, o norte-americano gaiteou pra todo mundo então.
Sem vergonha de ser nostálgico e com preguiça de criar em cima de elementos já muito utilizados, Junk quase não inova, mas de lixo só tem o nome.    
 Parece que esta playlist tem todas as canções:

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