Roberto Rillo Bíscaro
Se astros de primeira grandeza nos 80’s, como Cindy Lauper, lançam álbuns que podem passar despercebidos, porque a grande mídia não
mais noticia, imagine os trabalhos daqueles de segunda magnitude pra baixo.
Mesmo conferindo constantemente a mídia alternativa e de fãs, coisas passam em
branco, porque não dá pra checar diariamente sítios de todos os espectros
culturais que interessam. Assim, foi por puro acaso que descobri que Jimmy
Somerville lançou Homage, homenagem à discomusic, em março do ano passado. Já tem até álbum de remixes, lançado há
semanas, e eu sequer sabia do original.
Jimmy Somerville foi razoavelmente famoso na Europa e
Austrália e desfrutou dalgum sucesso nos EUA. Como vocalista de 2 grupos synthpop de status mediano, o escocês
periga não ter o nome conhecido pelo público médio, mais ligado numa ou noutra
canção. Em 1984, à frente do Bronski Beat, conheceu o sucesso com Smalltown
Boy, usada na trilha da novela Um Sonho A Mais (1985) e citada no álbum The Desired Effect (2015), de Brandon Flowers. Sempre explícito sobre sua postura
política trabalhista anti-Thatcher, o Bronski Beat chegou a tocar em apoio aos
mineiros galeses em greve, conforme retratado no filme Orgulho e Esperança.
Em 1985, cofundou a dupla The Communards, com Richard
Coles, hoje membro da Igreja da Inglaterra. Misturando elementos de High-NRG e disco music ao agonizante synthpop como subgênero comercialmente
predominante, o The Communards garantiu seu nome na história do pop britânico,
pelo menos como efeméride: a regravação de Don’t Leave Me This Way, originalmente
gravada por Harold Melvin and The Blue Notes, foi o single mais vendido na ilha, em 1986. A versão dos Communards foi calcada
na da diva disco Thelma Houston.
Em 88, Jimmy ficou de mal com Coles, saiu em
carreira-solo e no ano seguinte regravou You Make Me Feel (Mighty Real),
clássico disco na voz do falecido
Sylvester, cujo falsete Somerville sempre emulou. Read My Lips, o primeiro
solo, colocou alguns singles no Top 30 britânico, sinalizando pra Polygram que era
hora de lançar álbum de grandes sucessos, forma das gravadoras dizerem que o
período áureo [=lucrativo] dum artista já passara. Nos 90’s/00’s/10’s, o cantor
lançou álbuns esporádicos em selos menores. Como gosto, mas não amo (amo algumas
canções, tipo Smalltown Boy, sublime!), perdi sua pista, embora tenha ouvido um
álbum dos 10’s, que achei legalzinho.
De todo modo, recomendo com intensidade este O Melhor
de...
Quando descobri que Homage revisitava a era disco music, assanhei. Jimmy entende do
babado e por se tratar de material próprio, fui conhecer. Muito saltitante e
perito.
A ideia era reproduzir a sonoridade disco com seus cacoetes mais característicos, então, está tudo lá:
baixo rebolativamente balofo, naipe de metais, onipresença daqueles arranjos de
cordas à Hooked On Classics e todos ruídos que nos fazem imaginar estar no
Dancin’ Days, com globo espelhado (saca a capa do disco), dançando no Studio
54, com Sônia Braga.
Homage merece ser comentado mais no atacado do que no
varejo. Ao invés de apontar influências em faixas como Back To Me e dizer que é
fusão de Delegation com KC & The Sunshine Band, melhor dizer que 9 das 12
canções são puro deleite dançável, onde você ouvirá de Chic a The Trammps,
passando por Sister Sledge e eurodisco e remetendo a canções como Born To Be
Alive (1079), de Patrick Hernandez.
Somerville ferve, lacra, diva em pauladas dance como Strong Enough, Travesty,
Lights Are Shining e Bright Thing. Desde sempre do lado de fora do armário, na
nilerodgeriana Freak ele grita que precisa de homem que o entenda. A voz
continua arejada, aguda, embora na faixa de abertura, Some Wonder, alguns segundos
me deixaram apreensivos pelo resto, mas à altura da faixa 2 eu já estava quase
dançando na esteira (Homage é delícia pra ouvir malhando); pura alegria disco berrada, com instrumentos de
verdade tocados por gente real. Não que eu tenha algo contra música sintética
(we are the robots, we are the robots), mas há certa organicidade que só a disco music possui.
Bem no centro de Homage, fica The Core, midtempo que evoca o esquecido Eruption
ou a diva de outrora, Grace Jones. Learned To Talk fecha o álbum com outra
baixada no ritmo. Sorte que a tônica de Homage não é a dessas canções, nada especial.
O escocês afirmou que
tencionava homenagear o estilo de música que marcou sua adolescência em Glasgow
produzindo um álbum a altura. Completou que se tratou dum trabalho cujo
resultado deixou-lhe nervoso, devido à responsa. Espero que o mais de ano desde
o lançamento tenham-no acalmado. Homage é homenagem muito bem feita de quem
entende do assunto.
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