segunda-feira, 13 de junho de 2016

CAIXA DE MÚSICA 222

Roberto Rillo Bíscaro

Aos 6, 7 anos, minha “ídala” máxima era Gal Costa. Amava o berreiro da fase Tropicalista. Tinha os 2 álbuns de início da carreira, que minha irmã comprara usados, acho, e ouvia sem parar o psicodelismo de The Empty Boat, Pulsars e Quasars, Meu Nome É Gal. Maria da Graça miava, latia, gritava. Mas também havia a doçura chapada de Baby. Ainda ouço muito e continuam sendo 2 dos maiores discos já feitos.
Àquela altura – 74/5 – Gal já não era roqueira e progressivamente assumia ares merecidos de diva/madona da MPB. Segui gostando, fui a show em 87 ou 88 – gostosíssima no palco e cônscia disso, o gargalo lotado de lésbicas delirantes e fazendo o tolo RÁ, modinha 80’s já nem lembro direito porquê – embora não me conforme com a regravação de Baby; chacinar uma das mais lindas canções da MPB, que, ainda por cima ela mesma gravara!
Gostos se alargando de modo que gosto de acreditar eclético, fui perdendo a trilha de lançamentos de Gal, mas ela é a única responsável por a) eu curtir coisas alternativas, “bizarras” e “diferentes”, porque o pontapé veio dela, b) notar que era melhor não ser careta. Conforme ela se convencionalizou (no bom sentido), pagou o preço de ter me ensinado a cavucar o alternativo e esnobar a grande imprensa e, no processo, sequer soube do lançamento de Estratosférica, há mais de um ano. E que orgulho de tê-la como madrinha do gosto musical; o álbum está muito bom.
Por ter atravessado gerações e mudado de estilos, a cantora pode não agradar a todos com seus álbuns, mas Estratosférica tem pra desde quem curte rock até pra moçada mais nova que pode tê-la conhecido melhor com o eletrônico Recanto (2011). Caê Velô saiu da produção, mas o filhão Moreno continuou e uniu o tradicional ao moderno.
A abertura vem com as guitarras psych nervosas de Sem Medo Nem Esperança, provando que Gal still rocks! A canção-título seria descrita como afoxé nos 80’s; Quando Você Olha Pra Ela é sambinha-Benjor-esquema-novo; Casca é eletrônica EDM; Muita Sorte é synthCaymmi, eletrococo; Ilusão à Toa é daqueles boleros domesticados que consagraram a intérprete nos 80’s, tem até letra na segunda pessoa do singular. Além dela, Estratosférica traz baladas lindas, que tocariam muito nas rádios em outro contexto musical: Jabitacá, Espelho D’Água, Amor Se Acalme e Dez Anjos são desse jaez.
Por vezes, moderno e tradicional coexistem. Ecstasy tem ritmo bem de dança de salão de programa Festa Baile, mas o êxtase amoroso vem gravado e pronunciado como a droga do coração das raves acidhousistas. A maliciosa Por Baixo é pipocar eletrônico, mas a interpretação de Gal não está tipo Canta Brasil de vez em quando? A pedestre Você Me Deu coloca cordas melosas com barulho grave à Bjork.
O deslize vem em Anuviar. Moreno achou que encher a canção de pausas a tornaria avant garde, mas ficou apenas chata e pulável no sentido de a desprezarmos na audição.
Ainda que o álbum não o seja, Gal Costa continua estratosférica. 

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