FRAGILIDADES DEMOCRÁTICAS: triste panorama atual.
José
Carlos Sebe Bom Meihy
Os
dados são alarmantes: apenas 16% da população russa aprova a democracia; nos
Estados Unidos, a campanha presidencial aponta o acirramento da disputa que pode
colocar o ultraconservador Donald Trump no posto mais alto e consequente da
maior economia do mundo; na Síria, o regime autoritário de Iasar Arafat afugenta
participações democráticas; países importantes do mundo árabe – como a Arábia
Saudita – se impõem como modelo autoritário; Israel mantém um poderio que
diminui as chances de participação democrática dos países vizinhos e força a
guerra permanente; na América Latina, os regimes de base popular sofrem os
danos de desmandos e corrupção, após alguns anos de algum fulgor. Aliás, pelo
reverso, na Argentina e no Peru, governos simpáticos às políticas neoliberais
despontam com vigor, sendo contrastadas com a penúria da Venezuela, Bolívia,
Nicarágua. A par de tais constatações resta-nos questionar das razões gerais dessa
virada, pois, afinal, como explicar o fenômeno em escala global? Será que a
democracia representativa não tem mais lugar no mundo de hoje? Seria coisa do
passado? O que se colocaria no lugar?
Não
é desprezível considerar que a História se move em ciclos progressivos que,
como espirais, implicam espécies de retomadas, sempre impulsionadas por valores
antigos. Na mesma ordem, segmentos reacionários se assumem como baluartes do
progresso e do desenvolvimento econômico que, em últimas análises, é medido
pela conjugação do aquecimento do mercado material, combinando trabalho/emprego
com o consumo ativo e sempre crescente. A garantia dessa comunhão consagra o
capitalismo avançado em sua forma mais consistente, ou seja, sobrepondo a
riqueza a outros valores que seriam coadjuvantes e nutrientes de um tipo de
progresso. Assim, a educação, saúde, programas sociais em geral, funcionariam
como suportes para o tal “desenvolvimento” que deveria vigorar a qualquer custo.
A qualificação da prioridade do problema econômico coloca outro ponto
importante na equação: como conduzir o processo político que ampararia tal
projeto?
Em
jovens democracias – como é o caso do Brasil – preside uma dúvida constante,
ligada à presença de uma elite que não aceita mudanças no comando. E como a
História pesa neste andamento! Depois de se valer do mais longo e duro processo
escravocrata da humanidade, contando com cerca de 4,2 milhões de negros
negociados da África para o Brasil, passados 400 anos daquele sistema, ainda
não conseguimos integrar largos fragmentos da população que povoam favelas e
prisões e vivem condenados à marginalidade. Os números, mais que reveladores,
assustam, pois, segundo a Revista Carta Capital desta semana, mais de 60% da
nossa população carcerária é composta de negros. E que dizer dos totais
estampados pela CPI do Senado, sobre assassinatos de jovens negros, dando conta
que por ano 23.100 deles, contando de 15 a 29 anos são mortos? E note-se que perfazem
o total de cerca de 63 por dia, um a cada 23 minutos. Frente a essa realidade
doída ainda se pergunta com perplexidade, como alguém pode ser contra cotas
escolares, de trabalho e lugares políticos? Como?
Vendo em
perspectiva histórica, a hegemonia branca, machista, elitista ainda comanda a
ação política comunitária nacional. Sem crítica, o que se vê é a repetição de posturas
autoritárias, pelas quais o que interessa é a riqueza nacional a qualquer preço.
E isso tem sido lei no Brasil, onde sucessivamente se repetem golpes contra a
democracia, um atrás do outro. E o pior, tudo acontece em nome dela própria,
sob as vestes de interpretações constitucionais. Mas tem jeito disso mudar?,
pergunta-se. E a resposta vem a galope: tem. Tem se formos sérios na defesa de
um regime que não pode ser confundido com governos. Governos erram e temos
mostras evidentes disso. E erram muito, insiste-se, mas suas formas corretivas
devem antes de mais nada respeitar as regras que, mais que qualquer coisa,
legitimam as eleições. Sem o voto popular respeitado não há como evitar desmandos
e sem ele, sem democracia, somos fadados à submissão autoritária. As eleições
estão aí. Mais que escolher candidatos, cabe, com entusiasmo escolher a
democracia. Bom voto a todos.
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