terça-feira, 25 de outubro de 2016

TELINHA QUENTE 235

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Roberto Rillo Bíscaro

A guia turística espantou-se quando mencionei minisséries islandesas, durante visita à ilha. São apenas 300 mil habitantes; eles não esperam que conheçamos mais que Bjork, mas parece que canal pago brasuca já exibiu O Penhasco. De qualquer modo, é uma TV muito desconhecida mesmo. Além d’O Penhasco, resenhei 2 temporadas de Pressa.
Quando a BBC exibiu os 10 capítulos de Trapped (em islandês é Ófærð), a partir de fevereiro deste ano, deve ter impulsionado como nunca o interesse pelo país e sua TV. Trapped marcou a entrada em grande estilo da Islândia na liga de geradoras de densas tramas Nordic Noir. E jogaram pesado: o idealizador é ninguém menos que o diretor de cine mais famoso da ilha, Baltasar Kormákur, que tanto dirige filmes locais, como O Sobrevivente, mas também blockbusters, tipo Evereste. Ele não dirigiu a maioria dos episódios, mas seu prestigioso nome ajudou deveras.
No rigoroso inverno do norte islandês, numa aldeia no meio de lugar nenhum (pra usar termos do roteiro), um ferry chega da Dinamarca e simultaneamente um torso esfaqueado é encontrado. Como o assassino pode estar no navio, todo mundo é confinado no vilarejo pesqueiro. Pra piorar, uma tempestade de neve bloqueia as estradas, daí o título, algo como Encurralado. Os passageiros, tripulação e locais estão isolados e com um assassino a solta. Mas, será que todo o mal veio de alhures ou a pasmaceira aldeã esconde rede de ruindade nervosa? Nem precisa ser experto em thriller psicológico pra saber a resposta.
Trapped tem avalanche, incêndio, ganância, tráfico de mulheres, violência doméstica, vingança e efeitos da bancarrota do final da década passada, quando a Islândia faliu. O encurralamento não é apenas geográfico, mas também psicológico: é muita gente que não consegue escapar do passado, de relacionamentos viciados. O tom reservado dos escandinavos e a ambientação fazem de Trapped hipnótica bola de neve que cresce aos poucos e te acerta em cheio em sua incessante depressão. Dá frio psicológico em pleno calor tropical.
A cidadezinha gelada que quer se inserir no mundo global, mas esconde neuroses mil fatalmente remete a Fortitude, tentativa britânica de Nordic Noir. Enquanto a aldeia polar planejava um hotel de/no gelo, em Trapped há um porto que serviria pra rota comercial China-EUA. O que Fortitude forçou a barra pra ser, Trapped é sem esforço aparente. A série inglesa quis ser maluquete à Lynch/Cronemberg, mas jamais causa empatia, ao passo que em Trapped há muita doideira subjacente, mas sem tentativa de ostentar. Ambas me deixaram frio; a inglesa no sentido pejorativo; a islandesa como consequência de todos os elementos invernais armados pra congelar a espinha da gente.


Encabeçando o elenco, Ólafur Darri Ólafsson, favorito de Kormákur, como o policial tristonho transferido da capital pro interior, por haver cometido erro. A carona do casmurro grandão, encapotado pelo cortante frio, conquista a simpatia logo. O rol de escolhas obviamente não é extenso em país tão diminuto, então os familiarizados com cine e TV islandesas reconhecerão muitas fisionomias, embora pra nós os nomes sejam esquisitos. Nína Dögg Filippusdóttir, que já teve até resenha-dobradinha no blog; Ingvar Eggert Sigurðsson, de Málmhaus e até o dinamarquês Bjarne Henriksen (que barrigudo!) estão lá. A grata descoberta pra mim foi de Ilmur Kristjánsdóttir, como a policial Hinrika; amei.

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