segunda-feira, 30 de janeiro de 2017

CAIXA DE MÚSICA 250

Roberto Rillo Bíscaro

Uma das características arroladas ao pós-modernismo é o pastiche, cópia celebratória de estilos passados, bem ao gosto de nossa época que quer tudo hiper-real, na esperança de recriar/viver “experiências”. Essas discussões vieram à mente quando ouvi 2 álbuns lançados em setembro. Deliciosos, procuram imprimir a laser 2 vertentes musicais norte-americanas dos anos 60, sem brecha pra intromissões contemporâneas.
St. Paul And The Broken Bones é um sexteto de soul music do sulista Alabama. Em 2012, Paul Janeway (vocais), Browan Lollar (guitarra), Jesse Phillips (baixo), Andrew Lee (percussão), Al Gamble (teclados) e Allen Branstetter (trompete) fundaram a banda, que já tem 2 álbuns, 2 EPs, é elogiada pela crítica e faz turnês internacionais com saxofonista e trombonista, pra emular ainda melhor o som vintage que realiza. Sea Of Noise mente no título, porque é um mar de soul à Marvin Gaye, cantado com aquela voz suave característica de muitos clássicos do subgênero, desde Smokey Robinson ao oitentista Roland Gift ao contemporâneo Dornik. Confira se a sexy Flow With It não faz jus ao título; puro Gaye early 70’s; já valeria o álbum. Mas, tem mais. Midnight On The Earth tem o baixo rebolante e a melodia circular que originaram a disco music, mas no fim tudo é engolfado pela luxuosa orquestração. Não faltam R’n’Bs intensos, lentos, que podem ser dramáticos com I’ll Be Your Woman ou sensuais, como Sanctify. Brain Matter tem pegada mais pop, ao passo que Is It Me e Waves enveredam pelo gospel e La Bruit resvala pra psicodelia anos 60, única faixa que se aproxima do barulho do título.
The Excitements oferece prato teórico mais cheio ainda pra estudiosos da pós-modernidade. Seu som explosivo, calcado em feras como Wilson Pickett, Etta James e Ike & Tina Turner, reprodução perfeita e original do R’n’B mais visceral de fins dos 1950’s/primeira metade dos 1960’s é feito por catalães e uma vocalista moçambicana, cantado em fogoso inglês. The Excitements é Koko-Jean Davis (vocais), Adrià Gual (guitarra), Daniel Segura (baixo), Albert Greenlight (guitarra), Jose Luis Garrido (percussão), Nico Rodríguez Jauregui (sax barítono) e Jordi Blanch (sax tenor). Na ativa desde 2010, seus EPs e álbuns incendiários, aliados a turnês europeias constantes e contagiantes, o The Excitements conseguiu devotos seguidores e respeito no nicho R’n’B. Breaking The Rule deu sequência à emulação da sonoridade mais rústica de selos como Atlantic, Chess, Stax e a Motown do começo.
O título do LP também não deixa de ser mentiroso, porque nenhuma regra é quebrada; o som é revivalista até nos detalhes. As canções escolhidas pra covers entregam o ouro incandescente das influências: Fire, R’n’B proto-funk, de Gino Parks; Back To Memphis, de Chuck Berry, um dos pais do rock e Chicken Pickin’, blues eletrificado do Lonnie Mack. The Excitements é do sul espanhol e bebe do sul norte-americano; delta do Mississippi na cabeça e nos quadris, fustigados com locomotivas energéticas, tipo Wild Dog e apimentadamente dançáveis, como Everything’s Better Since You’re Gone, onde James Brown meio que desce em Koko. Também há exemplos de lentas intensas com influxo gospel, como a faixa-título, material que o belga (!) Vaya Com Dios ensinou a geração anos oitenta a curtir, com seu sucesso de 1990, What’s a Woman. Mas o The Excitements é melhor, porque mais orgânico.
No Bandcamp, dá pra ouvir/comprar os 2 álbuns do grupo:

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