segunda-feira, 8 de maio de 2017

CAIXA DE MÚSICA 264

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Roberto Rillo Bíscaro

Diversas vezes afirmei que os anos 90 meio que passaram em branco musicalmente, porque eu estava mais interessado em rechear minha coleção de produtos relacionados ao Genesis e ouvir coisas oitentistas. Mas, claro que vários artistas chamaram minha atenção, especialmente na primeira metade do decênio, ainda na ressaca da década anterior.
Em 1994, meu amigo Jayme apareceu com a trilha internacional da novela A Viagem e disse que eu deveria atentar pruma canção muito etérea, chamada Linger. A profusão de cordas e o vocal feminino me encantaram. Não fui o único. Durante uns 3, 4 anos, o planeta paparicou o The Cranberries com seu pop-rock filhote de Smiths com o dream pop psicodélico das bandas de nome curtinho da virada pros 90’s, tipo Ride e Lush. Dreams, Ode To My Family, Zombie; foram vários singles de sucesso, que começou a minguar conforme os irlandeses ficavam mais pesaditos e políticos.
Exceto por volta e meia reouvir a verve da sempre cantarolada Ridiculous Thoughts, no Youtube, fazia umas 2 décadas que não pensava nas frutinhas vermelhas e eis que dia 28 de abril, Dolores O'Riordan (voz), Noel Hogan (guitarra), Mike Hogan (baixo) e Fergal Lawler (bateria) biparam meu radar, com o lançamento de Something Else. É uma coletânea dos maiores sucessos regravados acusticamente e com a participação da Orquestra de Câmara Irlandesa, cujo estúdio na Universidade de Limerick (terra-natal dos Cranberries) foi usado pra gravar as 13 faixas: dez regravações; 3 inéditas.
O resultado é bastante bom, com canções como Linger ficando ainda mais delicadas e lindas. Confira a balada cinquentista When You’re Gone, que ganha até banjo. A longo prazo, porém, a sobreposição dos violões acústicos dos Cranberries com as cordas da orquestra torna-se uma massa sonora – ainda que lírica e harmoniosa – indistinguível. Faixas cujos originais eram mais agressivos, como Zombie e Ridiculous Thoughts, adquirem nuanças novas, mas será que algum fã troca? Prefiro o vigor dos singles noventistas nesses casos.
A voz distintiva de Dolores O’Riordan sempre foi um dos pontos fortes dos Cranberries. Sucesso pop não vem necessariamente pra quem tem a melhor voz à conservatório musical, mas pros que tem gogó marcante dalgum modo. Aos 45 anos, seu vocal não apenas encontra-se no topo, mas está mais rico e sua pronúncia mais clara (ou sou eu que entendo melhor inglês agora?).
Essa expertise vocal salta aos ouvidos na minha favorita dentre as inéditas, The Glory, onde ela consegue fazer canto de fadinha twee pop, sobre melodia de partir o coração. O single promocional de Something Else foi a faixa de encerramento, Why, emocionante balada sobre a perda do pai de O’Riordan. Rupture, a terceira inédita, não faz falta.

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