Roberto Rillo Bíscaro
Desde o término de Downton Abbey, órfãos e a ITV têm
buscado substituta. Os primeiros pra sonharem com um mundo de glamour, escapando
do saturado cotidiano da perigosa pós-modernidade líquida. A emissora britânica
pra repetir o sólido lucro de um produto exportável pra dezenas de países e
licenciável pruma enxurrada de produtos.
Os 8 episódios da temporada primeira de The Halcyon,
exibidos em janeiro e fevereiro, não tiveram outro objetivo senão fornecer à
rede britânica sua nova série de época lucrativa. Criada por Charlotte Jones,
The Halcyon se passa num luxuoso hotel homônimo de Londres, no ano de 1940,
quando os alemães efetivamente começam a ameaçar a Inglaterra, a Segunda Guerra
passa a fazer parte do cotidiano britânico e a capital do antigo império começa
a sofrer monumentais bombardeios pela aviação nazista. E pensar que gente
poderosa do governo, da Família Real e famosos nutriram simpatias hitleristas.
Hoje, isso está convenientemente “esquecido”, a não ser quando, no caso da
ficção, precisa-se de elemento negativo pra personagem da época. The Halcyon
não fugiria dessa regra.
Como em Downton Abbey, Downton Hotel, digo The Halcyon,
coloca num mesmo vasto, mas dividido, ambiente, personagens de distintas
classes sociais e desenvolve tramas entre eles, com muito conflito
folhetinesco. Há relacionamento amoroso intergeracional, interclasses,
interétnico, intergênero; dá pra escolher a transgressão. Embora alguns desses
temas pudessem ter sido aprofundados pra tentar disfarçar certa relevância
social à série, The Halcyon tencionava mesmo entreter escapistamente, então
tudo é tipo carcará: pega, mata e come. Não há tempo pra análise ou
problematização, mesmo que rasas. É só novela chique. E taca chantagem, leide
esnobe, muitos segredos e, pra dar a ilusão de cooperação de classes, o povo da
cozinha aparece em sua faina diária.
A produção é esmerada e opulenta, embora a situação seja
absurda. O centro de The Halcyon é o gerente, mais poderoso e com maior rede de
contatos que os lordes a quem serve. A série foi mesmo feita pra sonhar.
Mas, o público inglês fazia checkout do hotel a cada semana e os índices de audiência pioraram.
Talvez nem tanto por The Halcyon implorar quase chorando pra ser a nova Downton
Abbey, mas por ser difícil conectar-se de verdade com alguma personagem. É tudo
muito bem atuado, mas não há nenhuma pessoa pela qual desenvolvamos real
afeição. Quem não se lembra de diversos nomes de personagens de Downton Abbey?
Logo na primeira temporada, milhões já se apaixonaram por Mr. Bates ou The
Dowager Countess Of Grantham. E que show mata
logo no primeiro capítulo um lorde que poderia ser um vilão delicioso, apenas
pra seu filho mais velho ser promovido a lorde, mas isso não ter importância
alguma no enredo, porque ele passa a maior parte do tempo fora da telinha,
alistado na força aérea?
Dá pra perdoar a canção-tema, mais pra Massive Attack do
que pra swing anos 40, dá até pra
simpatizar com Toby ou Emma Garland, mas não pra torcer por eles, muito menos
amá-los, como ainda amamos Mrs. Hughes ou Mrs. Patmore. Por isso, a ITV fechou
The Haclyon e não haverá segunda temporada.
Como ficaram vários fios soltos, porque os criadores não
esperavam o cancelamento, não dá pra recomendar, a não ser que você precise
desesperadamente duma válvula de escape. Se for esse o caso, tente Feud, sobre
o ódio entre Bette Davis e Joan Crowford. Estou amando e logo comentarei.
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