Roberto Rillo Bíscaro
Em novembro de 2013, o País de Gales começou a deixar seu
nome na TV mundial com Y Gwyll. Afil(h)iada ao/do Nordic Noir, a série virou
sucesso cult vendido pra dezenas de
países e adicionada à grade da Netflix. As 2 primeiras temporadas estão lá, mas
não sei dos 8 capítulos da terceira, exibidos pela S4C, entre outubro e
dezembro do ano passado.
O elenco tem sempre trabalho dobrado, porque tudo é
gravado em galês e inglês. Até o título é duplo: a versão em inglês chama-se
Hinterland (é assim que você encontrará no menu da Netflix). Prefiro ver na
língua mais velha das Ilhas Britânicas, porque adiciona à cor local e acho
curioso como inserem palavras anglófonas nos diálogos, exceto o DCI Tom Mathias,
curiosamente um “forasteiro”, porque vivia em Londres e foi transferido pro
interior de Gales. A aderência irrestrita ao idioma local talvez seja
simbologia da sua tentativa de reenraizar-se.
As histórias são novamente divididas em 2 capítulos; a
novidade fica por conta de uma investigação interna envolvendo o próprio
Mathias e seus colegas, que se estende por todos os episódios, até dominar a
narrativa no último. A qualidade dos roteiros permanece, mas não dá pra negar
que as 2 primeiras histórias sejam um pouco precipitadas por causa dessa trama
paralela maior, que de início nem interessa tanto, mas avoluma-se até se tornar
típico Y Gwyll: caso arrepiantemente triste de desintegração familiar.
Um dos traços distintivos de Hinterland sempre foi
atestar que os perpetradores geralmente têm histórias desoladoras, motivadoras
dos crimes. Não que a série adote bandido de estimação, mas esclarece os
caminhos de desespero condutores aos hediondos atos, cujos resultados muito
frequentemente são exibidos de forma perigosamente estetizante, herdada do
Nordic Noir. Deve-se gastar horas de produção e filmagem apenas prum cadáver
teatralmente arranjado numa simulação de charco.
Espartanos em sorrisos e humor, DCI Mathias e DI Mared
Rhys expressam fisionomicamente seu pesar por terem que prender quem cometeu
barbáries pra se libertar ou alguém querido de relacionamentos abusivos,
extorsivos e violentos. Richard Harrington e Mali Harries transmitem mundos
apenas pelos olhares e pequenas contrações faciais.
Hinterland - como seu congênere Celtic Noir, Shetland – é
Romântico na ambientação: a natureza dialoga com o estado de espírito
depressivo, anestesiado, triste, de todas as personagens. Mesmo quando há sol,
todos estão encapotados, não há trégua para o vento frio galês. As vastidões
solitárias do mar e das áreas rurais em tons ocres sob céus noturnos ou
diurnos, porém carregadamente cinzas realçam a pequenez e soledade humanas. Nem
o verde tem o poder de conotar esperança ou fertilidade, porque a frialdade, o
desbotamento e às vezes o silêncio ou sua própria vastidão, tornam-no opressivo
e estéril e não pujante. Perséfone nunca visita Gales Ocidental (será por isso
que emigram em massa, ainda hoje?). Em seu lugar, deve ir seu marido...
Cenicamente, Y Gwyll continua espetacular, pra ver no inverno melhor ainda: dá
mais frio.
A S4C ainda não anunciou
quarta temporada e a terceira não deixa fios soltos. Será o fim de Y Gwyll? Se
for, terminou por cima, mesmo sendo um show beeeem pra baixo.
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