Roberto Rillo Bíscaro
Aranhas gigantescas são impossíveis, assim como enxames
inteligentes invasores de cidades, por isso tais catástrofes não dão medo
maior, a não ser sustos pontuais. Incêndios e terremotos - em Los Angeles, por
exemplo, onde haverá um devastador, segundo geólogos – nos deixam mais
inseguros. Incêndios também apavoram: quantas fatalidades num prédio londrino,
há poucas semanas!
A Noruega possui várias dessas bombas-relógios cataclísmicas.
Seu solo enrugado tem várias montanhas que fatalmente despencarão asseguram os
cientistas. O problema é que não se sabe quando, e isso pra assustar, vem
melhor que qualquer encomenda. Se a comunidade que um dia será soterrada por
rocha ou água for escandalosamente linda e turística, como Geiranger, melhor
ainda.
Esse enredo pronto pra cine-catástrofe não passou
despercebido pra Roar Uthaug, fã do subgênero, e diretor de A Onda (2015),
constante do catálogo da Netflix brasileira.
A fita tem todos
os elementos dos tradicionais filmes de catástrofe. Kristian é geólogo em seu último
dia de trabalho no observatório da montanha Åkerneset, que todo mundo sabe
cairá no fiorde resultando em devastadora onda tsunâmica, que engolfará
Geiranger, num prazo de 10 minutos a partir do deslizamento. Kristian descolara
trampo na bilionária indústria petrolífera norueguesa, então partiria antes da
esposa e do filhão, que teriam que ir ao hotel, onde mama trabalhava e
precisava cumprir mais um dia de serviço. É óbvio que nesse derradeiro dia de
Kristian, os sensores - que acusaram anormalidade no dia anterior, mas ninguém
deu bola – vão à loucura e Åkerneset vem abaixo. A partir do momento que a
avalanche atinge o lago fiordal, Kristian tem os tais 10 minutos pra salvar sua
família.
Cine-catástrofe exige espetáculo de efeitos especiais,
por isso é associado a Hollywood, onde jazem os orçamentos milionários. Assim,
é pertinente especular se a indústria cinematográfica norueguesa tem cacife pra
brincar de Tinseltown. Quem não viu,
fique tranquilo: embora longe da grandiosidade norte-americana, o impacto do
tsunami em Geiranger é bem decente.
Uthaug compensa defasagem em relação à Hollywood,
dirigindo uma película cheia de suspense e que, justamente por não ser
norte-americana, coloca a espectador em dúvida algumas vezes por não sabermos se
a Noruega seguirá todas as convenções estabelecidas pelos estadunidenses. Será
que esses escandinavos “frios” deixarão Kristian salvar sua família presa no
hotel? Essa desestabilizada de leve em nossas certezas e adivinhas de tramas já
valeria pra surfar nessa Onda.
Mas, Uthaug quis narrativa que não destoasse tanto da
usual desse subgênero, então, diversos elementos familiares estão presentes.
Convivemos dezenas de minutos com Kristian e sua família, cuja filha carrega
urso de pelúcia e tudo, pra gente amar. Criada a empatia com um núcleo, quando
desaba o desastre, vemos seres-humanos morrerem horrivelmente empalados e nem
ligamos, afinal já temos o nosso “nós”. Os demais, são o Outro. Que morram, é
pra nossa diversão.
Parte pela manipulação emocional que faz com que nos
importemos apenas com poucas pessoas, parte devido ao orçamento, quando
Kristian vai reencontrar mulher e filho, a cidade pós-tsunami – que tem espaços
secos pra pequenas e convenientes fogueiras iluminadoras do cenário – resume-se
a esse núcleo, além de uma personagem complicadora da situação, também
convencional em filmes-catástrofe. Que seja interpretado por ator dinamarquês
(Thomas Bo Larsen) diz bastante das pequenas rivalidades e antipatias cordiais
entre os escandinavos.
Fosse apenas como
curiosidade cinematográfica “exótica”, A Onda não mereceria recomendação, mas o
filme é bem-feito, tenso e divertido. O empreendedorismo de Roar Uthaug
compensou: Hollywood já o recrutou pra dirigir a revitalização da franquia Tomb
Raider, que estreará em 2018.
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