DUAS AVENTURAS COLOMBIANAS
José
Carlos Sebe Bom Meihy
A convite da Pontifícia Universidad Javeriana, de Bogotá,
na Colômbia, ministrei breve curso de história oral, entre os dias 09 e 14 de
outubro último. Desmentindo a noção de que os colombianos são flexíveis e algo
folgados, ou que seriam uma espécie de eco do comportamento brasileiro, fui
desprevenido para o volume de trabalho que tive que cumprir. Curso pela manhã,
repetição para outra turma à tarde, encontros de trabalho depois da aula, uma
aula magna. Isto tudo sob frio e variação de temperatura, inclusive com chuva.
Foi uma semana intensa, mas que, em medidos intervalos me permitiu visitar
amigos muito queridos. Sim, nas intermitências fugia dos compromissos e assim
pude conviver com outras tribos, pessoas com as quais troco experiências
acadêmicas e de afetos desde 2009. Num desses dias, exatamente no dia 11, numa
brecha cavada na agenda, fui vê-los para jantar. O arranjo do local foi feito
por eles, que escolheram magnifica tratoria italiana, no simpático bairro de
Macarena. A alegria da conversa se fez progressiva enquanto multiplicávamos
assuntos, acertando temas desdobrados desde nosso derradeiro encontro, há pouco
mais de um ano. E não faltavam temas: o acordo de paz, os efeitos do Prêmio
Nobel entregue ao Presidente Santos, as consequências da entrega de armas das
FARC, a visita do Papa. E tudo regado a comparações com a situação do Brasil.
Em uma espécie de disputa, medíamos desgraças, pois apesar das aparentes
conquistas colombianas, a corrupção tinha se instalado de maneira mais
definitiva do que se pensa. E estávamos competindo nessa seara, cada parte
tentando mostrar que nossos políticos eram os piores. A contenda seguia célere
quando, de repente, sem que houvesse qualquer suspeita, o motorista que havia
nos conduzido desde o meu hotel, adentrou e, ante a surpresa de todos,
perguntou se alguém havia deixado cair um celular. Imediatamente, consultamos
nossos bolsos e era exatamente o meu. Empalideci, pois o meu aparelho tinha
pouco mais de dois meses e, novamente, eu o teria perdido. Alejandro, marido de
minha companheira de trabalho, Alba, e eu levantamo-nos, fomos em direção do
carro que estava à porta e ouvimos de uma gentil senhora, passageira que se
sentou no espaço que ocupei, reconheceu-me pela foto no visor do aparelho e
devolveu meu objeto. Feita a gentileza, voltamos ao salão, pusemo-nos a medir a
grandiosidade da distância entre governos que roubam e pessoas da sociedade
civil que desmentem a perenidade cultural de situações que implicam veto em ficar
com o alheio. Reinou certa perplexidade, mas daquelas com final feliz. Abraços
de despedida, promessas de novos encontros e restava a lição da honestidade
popular.
Os dias passaram rápidos, e
entretido em tantas atividades, apenas tive o sábado para lazer. O primeiro de meus
intentos era voltar ao Museu Botero, um dos meus centros favoritos no mundo. Essa
nova empreitada começou com a chamada de um táxi. Marquei o número do chapa que
terminava numa combinação fácil de dia e mês de meu aniversário. Perdido na
magnífica coleção, tão entretido estava que não notei que antes, ao pagar o
motorista, havia deixado cair meus pesos colombianos, algo em torno de 200
dólares, dinheiro reservado para a compra de pequenas lembranças para
familiares e amigos. Apenas dei conta quando fui efetuar o pagamento de
suvenires adquiridos ali mesmo, na loja do Museu. Outra vez me acometia aquela
sensação desagradável de frustrações. Em outro táxi, experimentei mais uma vez
a amabilidade do motorista que entendeu a situação e se dispôs a me levar de
volta ao hotel, e resolver novo câmbio de moeda para efetuar a paga da corrida.
Resolvido o caso, com ajuda do pessoal do hotel, chamei o táxi anterior e...
e... em alguns minutos estava o motorista que havia recebido de outro
passageiro minha carteira com o dinheiro, cartão de crédito e um documento de
identidade. Alegre, surpreso, superei a recriminação pessoal, comum nesses
casos, pela consideração da honestidade popular. Voltei, fiz minhas comprinhas,
passeei mais um pouco e já no aeroporto me coloquei assinalando os feitos das
experiências. Poderia dizer que o ganho foi grande. Aprendi que tanto vale
pesar a corrupção sistêmica, da política, como também ver o avesso disso tudo.
Presidem na sociedade seres honestos e capazes de gestos grandiosos. Vou tomar
mais cuidados com objetos e dinheiro em próxima viagem, mas não quero perder a
esperança de crença nas pessoas comuns.
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