Gutemberg é o grande responsável pela literatura barata
em mais de um sentido. A produção em massa cada vez maior, aliada a crescente
alfabetização e sede por entretenimento, há séculos vem despejando jorros de
histórias rápidas, sensacionalistas e frequentemente viciantes. Folhetins
rocambolescos, penny dreadfuls, dime novels, a quantidade de gente escrevendo
por migalhas pra ser vendido por mixaria é caudalosa.
Mais ou menos entre a década de 1920 ao fim da de 40,
ocorreu o apogeu e desmonte da pulp
fiction, assim denominada porque os livretos eram feitos com polpa de
celulose, por isso custavam centavos. Na época da Depressão trintista isso
seria mão na roda pros milhões sem grana, que queriam escapar um pouco da
realidade horrenda do desemprego, mediante fartura de subgêneros: as revistas
de pulp fiction flutuavam pelo
western, horror, ficção-científica, policial detetivesco, fantasias, aventuras
(que tinham subgêneros dentro do subgênero, como aviação, egiptologia etc) e
até pornozinho soft.
Pulp
Fiction: The Golden Age of Sci Fi, Fantasy & Adventure, também subtitulado The
Golden Age of Storytelling (2010) começa a dar conta desse universo esnobado
pela crítica literária, mas guarda armadilha que precisa ser desarmada, pra
extrair a polpa.
Na pulp
fiction começaram autores importantes como Dashiel Hammett, Raymond
Chandler, Ray Bradbury, Isaac Asimov, Arthur C. Clarke, H. P. Lovecraft. Mas, o documentário não perde a oportunidade
de insistentemente incensar o medíocre L. Ron Hubbard, prolífico pulper, mas muito mais badalado por meia
Hollywood como criador da igreja da Cientologia. Então, cuidado: o documentário
é propaganda subliminar ma non tropo dessa
arapuca religiosa.
Uma vez
protegido do proselitismo disfarçado, o documentário pode ser curtido como
introdução a esse universo de papel barato e capas chocantemente coloridas em
cores primárias. Luke Skywalker e Indiana Jones são netos cinematográficos dos
incontáveis heróis da pulp fiction;
os queridos detetives deprês do Nordic Noir são filhos de Sam Spade e Philip
Marlowe, por sua vez prole dos primeiros detetives beberrões e ásperos da pulp fiction. Heróis dos quadrinhos são migrações
pulp.
No afã
propagandista de defender seu herói, alguns comentaristas desnecessariamente detonam
a “alta” literatura, embora quantos críticos eruditos desta não fazem o mesmo
com a “cultura de massa”, não? Mas, é bem legal saber alguns detalhes da
produção, como o salário de miséria pago aos escritores e ver a profusão de
capas exibidas, provavelmente o quinhão mais saboroso do documentário.
Como o
pop não poupa ninguém, a pulp fiction, que já era transformação de algo
anterior, também metamorfoseou-se em serial,
literatura em capa de papelão, daquelas abundantes em aeroportos; filmes, que
disfarçam a pulpice com efeitos
especiais; séries de TV e quadrinhos, também procurando camuflar sua matriz pulposa, mediante a criação de “mitologias”.
Assim,
releve o engodo de Hubbard como escritor de importância e aproveite o lado
cheio desse copo de pulp fiction,
disponível no Youtube:
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