Roberto Rillo Bíscaro
É bem grandona a lista de filmes de horror que retratam
como se dão mal pessoas que cometem a bobagem de sair do Primeiro Mundo pra se
aventurar no Terceiro. A selva do Peru, cultos na América Central, hostels na Eslováquia (Europa Oriental
não é Primeiro Mundo) enfim, o primitivismo com que somos associados (Brasil
não é Primeiro Mundo, né?) é potente no mundo Horroroso.
Quando selecionei Aftershock (2013), no menu da
Netflix, nem pensava nisso. Tudo que queria era ver um disaster film fora do eixo Nova York-Los Angeles. Se A Onda foi
legal, quem sabe um terremoto no Chile também não poderia ser? A sinopse
apontava pra isso e não estava errada, apenas não assinalava que a película
seria mistura de horror em clima de filme de sobrevivência pós-apocalítica bem
ao estilo lixo, de produtoras como a legendária Troma. A presença de Eli Roth
no elenco deveria ter me alertado que o negócio não seria muito bem comportado.
Em filme-catástrofe, às vezes quase dois terços são
gastos com exposição e construção de suspense (redundante, porque escolhemos o
filme X, pois sucederá um tsunami). Isso tem a ver com economia orçamentária,
mas também tem a função de domar o espectador sobre quem deve gostar, pra quem
torcer, com quem se emocionar e anestesiá-lo pras dezenas de outras mortes, que
podem constar na categoria “divertida”, porque é de personagem que “merece”
perecer ou de figurantes e, quem não conhecemos pode se ferrar que tá de boa!
Em Aftershock, um terço ou mais da parte inicial é
usada pra mostrar os amigos se divertindo à beça na colorida e praiana
Valparaíso. Estabelecem-se os arrogantes, cusões, piranhas, enfim, todos os que
podem morrer e não ligaremos, porque são ou fizeram algo “desabonador”. Há uma final girl que só faltava ter isso
tatuado na testa; há o papai com filhota em Los Angeles, ou seja, tem gente “de
bem”.
Daí, ocorre o terremoto, mas em na estrutura de
Aftershock a apresentação não vale pra absolutamente nada. Não é exagero; você
pode tranquilamente botar o filme pra rodar e fazer qualquer outra coisa,
porque todo esse tempo não constrói ou prepara pra nada. Comece a prestar
atenção, quando a discoteca tremer.
Quem sabe leituras acadêmicas não possam ser feitas no
sentido de interpretar todo o introito preparatório como metáfora cínica
pós-verdadeira de que nada prepara ou atenua ou justifica nada? Mesmo que assim
o seja, a estrutura de Aftershock é cerzida, porque tempo demais é perdido numa
exposição que leva a nada.
O terremoto propicia a fuga de presos, então Aftershock
vira exploitation film anos 70, com
violência, estupro e nojeira barata.
E nenhuma informação disponibilizada na parte pré-terremoto – mal-gravada a
ponto de parecer vídeo feito com celular – terá importância no pós-catástrofe,
porque o foco é em ver morte sem distinção.
Tem filme que ganha
respeitabilidade de parcela “cabeça” de cinéfilos, porque é tão ruim que vira
bom; sabe aquela vibe Plan 9 From
Outer Space (1959)? Aftershock é tão ruim que não vira bom, mas quem ama
mambembice trash pode gostar. Ri
gostoso em algumas partes.
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