Roberto Rillo Bíscaro
Lá por 2009, 10, uma aluna teen particular de inglês, muito conectada e musical, perguntou-me:
“Robert (em Penápolis, muitos assim me chamam pela profissão), um tal de George
Michael: ele foi famoso?” Talvez tenha sido então que finalmente percebi como
os referenciais da década que mais amo já nada significavam pruma geração.
Respondi a Natália, que mais ou menos uns 20 anos antes de sua questão, George
era um dos astros pop mais famosos do planeta, se não o mais.
Não adotei a coroca postura de lamentar “essa mocidade
que não sabe nada”. Imagine se em 1988 eu sabia algo sobre o povo que fizera
sucesso nos 60’s, a não ser os inevitáveis Beatles, Stones e um punhadinho de
gente mais. A vida pop é assim. A fila não anda, destrambelha. E está correto,
se não estaríamos ainda recitando ditirambos.
Eu mesmo abandonei o ex-Wham!; sequer ouvi Older (1996)
inteiro e o hit Fastlove nunca está
entre as que boto pra tocar no Youtube; até curto, mas foco nos 80’s. Nem sabia
que duetou com Mary J. Blige ou Whitney Houston. Ou esquecera?
(Re)descobri vendo o documentário Freedom, que George
Michael apenas finalizara, quando surpreendeu com sua morte, no Natal do ano
passado. Daí que me dei conta de como só sabia dele mais recentemente, através
de pequenas notas sobre escândalos ou doença.
Os 90 minutos são recheados de estrelas da música e da
moda, elogiando-o. Como em The Story Of Kate Bush, entrevistados ouvem canções
e as comentam e reagem. Freedom usa recurso mais de varanda gourmet, mas ainda
assim é esquisito ver as caras do pessoal ouvindo as canções. Nile Rodgers
chora; Liam Galagher simula karaokê, enquanto compara Michael a John Lennon e
pragueja; Elton John confessa inveja por não ter composto a abertura de
Freedom.
Muito competente e elegantemente controlado pelo
artista, Freedom não revela “podres”, como a prisão por solicitação sexual em
Hollywood. George saiu do armário porque estava pronto, não porque foi puxado
por um escândalo. Sei.
Também discorre muito sobre o processo movido contra a
Sony, porque o artista se considerava escravo (bilhões discordariam de você,
Georgy Porgy!). Há que se notar a eloquente ausência da outra metade do Wham!, Andrew
Ridgeley. Será que o “melhor amigo” não é tão A-lister como Mark Ronson ou Steve Wonder? One wonders.
Mas, no que foca, Freedom o faz com gosto e
sensibilidade, confessando sem pudor que George Michael sempre sonhou em ser
superestrela, mas quando isso ocorreu, não imaginava que seria em proporções de
supernova. Faith, seu torpedo pop soul,
de 1988, papou até os mais cobiçados prêmios da música negra e isso não passa
impune. O cara tinha talento, isso não dá para negar: ele duetou com Aretha
Franklin ainda nos 80’s!
George Michael escolheu a estrutura narrativa da diva
solitária, abatida por tragédias e descontente com a fama, que resolve
afastar-se dos holofotes, daí a ausência de promoção do álbum Freedom.
Essa escolha narrativa possibilita a tocante
sinceridade de Freedom, porque o músico dedica generosa porção a seu namorado
brasileiro Anselmo Feleppa, falecido em 93 devido a complicações pelo HIV.
Admitido como o amor de sua vida, Michael sequer pôde expressar sua dor
publicamente, porque ainda faltavam anos pra que assumisse publicamente sua
homossexualidade. Sua raiva então foi canalizada para o processo contra a Sony
e rendeu uma de suas performances ao vivo mais reconhecidas, o tributo a Fred
Mercury, também morto devido ao HIV. Imagine saber que você pode ser portador
de um vírus letal, perder o namorado e depois a mãe, de câncer.
Eu nem me lembrava da rusga entre George e a Sony e não
creio que faça muita questão de visitar o trabalho pós-Freedom, o álbum, do
qual esquecera até de faixas. Provável que nem Freedom o álbum, eu revisite pra
re-relembrar das canções olvidadas.
A dor e a delícia do pop talvez seja a de ser tão fugaz
que deixa apenas algumas marcas, essas indeléveis; jamais viverei sem Careless
Whispers. Mas, depois que passa a bola de fogo do cometa, a gente realmente não
se interessa mais tanto pela cauda.
Seja como for, Freedom, o documentário, serve muito pra
novas gerações conhecerem o auge desse superastro falecido há um ano. Também
faz quem acompanhou seu apogeu rememorar. Certamente haverá quem terá
curiosidade de conhecer o que veio depois de Freedom, o álbum, ou Older. Tomara.
Maravilha Roberto
ResponderExcluirCaro Roberto,
ResponderExcluir"Older" é, sem dúvida alguma, a grande obra do George.
A única em que pode, verdadeiramente, demonstrar a sua visão de arte, muito paradoxal, pois mistura a dança do soul com uma profunda melancolia, visível nas letras de desilusão amorosa e profissional.
Vale a pena dar uma chance.
Abs.