quinta-feira, 28 de dezembro de 2017

TELONA QUENTE 217



Roberto Rillo Bíscaro
Ano que vem, Halloween fará 40 anos e Jamie Lee Curtis voltará a interpretar Laurie Strode, icônico papel que transformou a filha de Janet Leigh e Tony Curtis na final girl mais famosa do universo slasher. Jamie afirmou que será a última vez que encarnará a personagem, mas fãs devem se lembrar que ela disse o mesmo, em 1998, quando de Halloween H20. Nem é necessário vasculhar arquivos pra checar a informação, basta assistir a Halloween: The Inside Story (2010), disponível em inglês sem legendas no Youtube.
Em seus 90 minutos, o documentário foca na produção do clássico mambembe de John Carpenter, que além de influenciar toda uma geração de cineastas trash, ainda tem uma das trilhas-sonoras mais reconhecíveis da história do cinema em qualquer subgênero. E composta por Carpenter! O desgramado é bom e sabe disso, basta ver a atitude blasê, de quem se acha. OK, ele até que pode.
Cuidadosamente evitando o anterior Black Christmas (1974) – que influenciou em muito Halloween - Halloween: The Inside Story é farto em minúcias e anedotas de produção, como explicar a profusão de folhas secas outonais de Illinois num filme gravado em plena primavera californiana. Canonizado em seu estatuto de clássico, já se pode até apontar alguns erros grosseiros, como membros da equipe aparecendo por detrás de arbustos e que tais.
Até personagens menores e extras dão depoimentos, além de críticos e executivos, então, é prato cheio pra fãs não apenas da franquia, mas de slasher films e horror em geral. Mas, admiradores da indústria cinematográfica gostarão de saber como era o esquema de lançamento dum filme no fim dos anos 70, quando a crítica especializada tinha forte poder pra (des)fazer uma película. Detonada nos jornais, a película só engatou nas bilheterias, depois que 2 críticos respeitados viram seu valor. Isso e o boca-a-boca fizeram de uma produção barata de 325 mil dólares (25 mil foi o salário de Donald Pleasence), o filme indie mais lucrativo durante uma década. 
Finalmente, um documentário que abordou o uso de “totally”, pela personagem Lynda. Hoje tão comum entre descolados, a atriz PJ Soles dá aula de “totally”. Você também aprenderá de qual ícone sci fi originou-se a máscara de Michael Myers, enfim, é muito divertido e totalmente informativo.
Falando em P. J. Soles, ela não solta nenhum totally enquanto narra os quase noventa minutos de Halloween: 25 Years of Terror (2006), que oferece visão bem mais panorâmica da franquia, inclusive com o impacto das comunidades de fãs impulsionadas pela internet e que influenciariam roteiros e produção dos filmes do século XXI.
O documentário abre obviamente falando da importância do original de John Carpenter, que tem em sua cotidianidade um diferencial enorme no horror ambientado em mansões góticas, sarcófagos, castelos medievais ou mesmo no sinistro Bates Motel, mais mundano que a Transilvânia, mas ainda muito rococó. Halloween se passa num subúrbio indistinto de milhares ao redor do mundo desenvolvido.
O que torna Halloween: 25 Years of Terror valioso é o passeio diacrônico, que pela data não pode englobar as releituras de Rob Zombie, mas em seu percurso de  quarto de século detecta as tensões e pressões que passaram a existir, quando Halloween deixou de ser produto indie pra se tornar peça valiosa do lucro corporativo. É por causa desse jogo de interesses – acoplado a crescente explicação do mal de Michael Myers – que os Halloweens dos anos 80 em diante, passaram a ser cada vez mais como qualquer slasher film inspirado no Halloween original. Mortes melequentas passaram a sobrepor o suspense.


Será que alguma sequência suplanta a aura do original? Por mais que ame Sexta-Feira IV, o primeiro filme – cópia de Halloween, que nem tem Jason Voorhees – tem um quê imbatível. No caso da obra de Carpenter isso é inconteste, porque Halloween praticamente deu as coordenadas dum subgênero do horror e depois se rendeu à sanguinolência de suas tantas imitações.
De todas as franquias “clássicas”, Halloween deu o escorregão mais espetacular. A parte 3 nada tem a ver com a mitologia de Michael Myers; onde já se viu isso? Lembro-me da raiva por ter me sentido enganado. Por mais que produtores expliquem que o conceito de franquia ainda era incipiente e que a trama proto-Black Mirror/pós-Invasores de Corpos nem seja ruim, o que importa é que a marca Halloween passou a significar filme com a personificação mascarada do mal e se possível com o Dr. Loomis, enquanto Donald Pleasance respirava. A resposta do público foi fracassar o filme na bilheteria, fazendo com que a franquia hibernasse pela maior parte dos 80’s, enquanto Sexta-Feira 13 e A Hora do Pesadelo enchiam cofres.
Em 1988, algum estúdio decidiu ressuscitar Myers e nos próximos anos pelo menos mais 3 sequências foram feitas, antes da repaginação de H20, em 1998. Como explica o título, o documentário Halloween 4, 5 & 6 (2013) minucia a produção dessas sequelas, com entrevistas com elencos, o relacionamento desses com a estrela Pleasance e seu sucesso ou fracasso comercial/”artístico”. Mesmo com filmes consagrados, é normal nesses documentários a inflação da importância, enfim, a construção de hype mitificante. Mas, quando isso acontece com bombas como as partes 5 e 6 fica difícil de engolir sem rir. Até se admitem os erros e entraves que implodiram os 2 filmes, mas elogiar tanto o 4 é duro. Assim, esse é o documentário menos essencial pra não fãs de carteirinha da franquia ou de horror (meu caso, nunca cultuei Michael Myers; sou bem mais o Dr. Loomis).

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