Roberto Rillo Bíscaro
Ano que vem, Halloween fará 40 anos e Jamie Lee Curtis
voltará a interpretar Laurie Strode, icônico papel que transformou a filha de
Janet Leigh e Tony Curtis na final girl mais
famosa do universo slasher. Jamie
afirmou que será a última vez que encarnará a personagem, mas fãs devem se
lembrar que ela disse o mesmo, em 1998, quando de Halloween H20. Nem é
necessário vasculhar arquivos pra checar a informação, basta assistir a Halloween:
The Inside Story (2010), disponível em inglês sem legendas no Youtube.
Em seus 90 minutos, o documentário foca na produção do
clássico mambembe de John Carpenter, que além de influenciar toda uma geração
de cineastas trash, ainda tem uma
das trilhas-sonoras mais reconhecíveis da história do cinema em qualquer
subgênero. E composta por Carpenter! O desgramado é bom e sabe disso, basta ver
a atitude blasê, de quem se acha. OK, ele até que pode.
Cuidadosamente evitando o anterior Black Christmas
(1974) – que influenciou em muito Halloween - Halloween: The Inside Story é
farto em minúcias e anedotas de produção, como explicar a profusão de folhas
secas outonais de Illinois num filme gravado em plena primavera californiana.
Canonizado em seu estatuto de clássico, já se pode até apontar alguns erros
grosseiros, como membros da equipe aparecendo por detrás de arbustos e que tais.
Até personagens menores e extras dão depoimentos, além
de críticos e executivos, então, é prato cheio pra fãs não apenas da franquia,
mas de slasher films e horror em
geral. Mas, admiradores da indústria cinematográfica gostarão de saber como era
o esquema de lançamento dum filme no fim dos anos 70, quando a crítica
especializada tinha forte poder pra (des)fazer uma película. Detonada nos
jornais, a película só engatou nas bilheterias, depois que 2 críticos
respeitados viram seu valor. Isso e o boca-a-boca fizeram de uma produção
barata de 325 mil dólares (25 mil foi o salário de Donald Pleasence), o filme indie
mais lucrativo durante uma década.
Finalmente, um documentário
que abordou o uso de “totally”, pela personagem Lynda. Hoje tão comum entre
descolados, a atriz PJ Soles dá aula de “totally”. Você também aprenderá de
qual ícone sci fi originou-se a
máscara de Michael Myers, enfim, é muito divertido e totalmente informativo.
Falando em P. J. Soles, ela não solta nenhum totally enquanto narra os quase noventa
minutos de Halloween: 25 Years of Terror (2006), que oferece visão bem mais
panorâmica da franquia, inclusive com o impacto das comunidades de fãs
impulsionadas pela internet e que influenciariam roteiros e produção dos filmes
do século XXI.
O documentário abre obviamente falando da importância
do original de John Carpenter, que tem em sua cotidianidade um diferencial
enorme no horror ambientado em mansões góticas, sarcófagos, castelos medievais
ou mesmo no sinistro Bates Motel, mais mundano que a Transilvânia, mas ainda
muito rococó. Halloween se passa num subúrbio indistinto de milhares ao redor
do mundo desenvolvido.
O que torna Halloween: 25
Years of Terror valioso é o passeio diacrônico, que pela data não pode englobar
as releituras de Rob Zombie, mas em seu percurso de quarto de século detecta as tensões e
pressões que passaram a existir, quando Halloween deixou de ser produto indie pra se tornar peça valiosa do
lucro corporativo. É por causa desse jogo de interesses – acoplado a crescente explicação
do mal de Michael Myers – que os Halloweens dos anos 80 em diante, passaram a
ser cada vez mais como qualquer slasher
film inspirado no Halloween original. Mortes melequentas passaram a
sobrepor o suspense.
Será que alguma sequência suplanta a aura do original? Por
mais que ame Sexta-Feira IV, o primeiro filme – cópia de Halloween, que nem tem
Jason Voorhees – tem um quê imbatível. No caso da obra de Carpenter isso é
inconteste, porque Halloween praticamente deu as coordenadas dum subgênero do
horror e depois se rendeu à sanguinolência de suas tantas imitações.
De todas as franquias “clássicas”, Halloween deu o
escorregão mais espetacular. A parte 3 nada tem a ver com a mitologia de
Michael Myers; onde já se viu isso? Lembro-me da raiva por ter me sentido
enganado. Por mais que produtores expliquem que o conceito de franquia ainda
era incipiente e que a trama proto-Black Mirror/pós-Invasores de Corpos nem
seja ruim, o que importa é que a marca Halloween passou a significar filme com
a personificação mascarada do mal e se possível com o Dr. Loomis, enquanto
Donald Pleasance respirava. A resposta do público foi fracassar o filme na
bilheteria, fazendo com que a franquia hibernasse pela maior parte dos 80’s,
enquanto Sexta-Feira 13 e A Hora do Pesadelo enchiam cofres.
Em 1988, algum estúdio
decidiu ressuscitar Myers e nos próximos anos pelo menos mais 3 sequências
foram feitas, antes da repaginação de H20, em 1998. Como explica o título, o
documentário Halloween 4, 5 & 6 (2013) minucia a produção dessas sequelas,
com entrevistas com elencos, o relacionamento desses com a estrela Pleasance e
seu sucesso ou fracasso comercial/”artístico”. Mesmo com filmes consagrados, é
normal nesses documentários a inflação da importância, enfim, a construção de hype mitificante. Mas, quando isso
acontece com bombas como as partes 5 e 6 fica difícil de engolir sem rir. Até
se admitem os erros e entraves que implodiram os 2 filmes, mas elogiar tanto o
4 é duro. Assim, esse é o documentário menos essencial pra não fãs de
carteirinha da franquia ou de horror (meu caso, nunca cultuei Michael Myers;
sou bem mais o Dr. Loomis).
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