J. B. Priestley foi um romancista, dramaturgo,
ensaísta, roteirista e radialista inglês, cuja obra anda meio esquecida, porque
a transposição de suas ideias socialistas para o papel/palco é bem pouco sútil.
Já nos 50’s, sua peça mais famosa era esnobada pela nova onda de dramas sociais
raivosos em voga na Inglaterra.
Pra se ter noção, An Inspector Calls estreou em Moscou,
em 1945 e apenas no ano seguinte na capital britânica. Seu tenaz reformismo social e lição de moral
vão na linha de Ibsen ou Shaw, com boa pitada do Dickens de A Christmas Carol.
Se artisticamente datada, a obra serve muito pra discussões sobre
responsabilidade social, por isso ainda hoje é parte da lista de livros
cobrados no GCSE (General Certificate of Secondary Education)
Os 3 atos se passam numa sala de jantar, em 1912,
quando o sistema de classes vitoriano/eduardiano vivia seus últimos dias, antes
da Primeira Guerra Mundial. Não é à toa que décadas depois, Julian Fellowes
começaria sua Downton Abbey no mesmo ano. Priestley já indica que a aristocracia
rural não dava mais conta de se manter sozinha no poder. An
Inspector Calls inicia com a família Birling jantando
em comemoração ao noivado da filhota com o filho dum lorde. Mas, Gerald Croft
não era proprietário de terras e sim industrialista. Na verdade, concorrente de
Arthur Birling, o patriarca que acredita que a única responsabilidade
importante é pra consigo mesmo e sua família. Só falta ele falar humbug! Sheila é a filha de rico,
caracteristicamente mimada, com aquela alegria irritante, que a gente adora ver
dinamitada. A mama é presidente duma instituição de caridade, que exorta amor
exigente pra suas ajudadas, mas não exige nada em casa (a peça não é de todo
tão datada, percebem?). E tem Eric, o também arquetípico filho infeliz e
bêbado, descontente com a fortuna familiar. E há a empregada, que abre e fecha
as portas e é invisível na peça, que se preocupa muito com a classe
trabalhadora, menos aquela da qual necessita pra sua carpintaria dramática.
Mmmm, uau, como não evoluímos muito desde 1945, 1912, whenever...
Chega então o Inspetor Goole, comunicando que a jovem
Eva Smith (sobrenome mais comum nos países de língua inglesa, um tipo de Silva
daquelas plagas) se suicidara tomando desinfetante. Desempregada, desesperada,
destituída, a só-virtudes não resistira à barra, que o inspetor prova, foi
culpa de todos os presentes, seja por omissão, exploração, capricho, seja por
demissão. Goole é o equivalente edwardiano das fitas de Hannah Baker.
An Inspector Calls defende que nossas ações – por
pequenas que sejam – repercutem socialmente e podem ocasionar tragédias, como o
suicídio de Eva. O pressuposto de 13 Reasons Why não é tão pós-moderno, after all.
Inegável que a peça esteja datada em alguns aspectos e
a dicotomia classe média alta/malvada, operariado/explorado bonzinho não se
sustente num discurso minimamente inteligente. Mas, ainda dá pra curtir o modo
como as personagens são acusadas e, convenhamos, a hipocrisia e rigidez moral
exigida dos outros ainda prevalecem.
Se você não quer ler o texto, existem as adaptações pra
cine e TV, que fazem bom trabalho.
A primeira vez que a peça
de Priestley ganhou as telonas foi em 1954. Claro que esta versão também está
“datada” pros padrões interpretativos de hoje.
Se quiser algo mais atual, há a da BBC, de 2015. Muito
bem produzida, com elencaço, tipo Miranda Richardson e Ken Stott.
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