terça-feira, 17 de abril de 2018

TELINHA QUENTE 305


Roberto Rillo Bíscaro

Celtic Noir surgiu na esteira do sucesso do Nordic Noir. Climática, geográfica e até étnica/culturalmente, o norte britânico é bem similar à Escandinávia. O caso do arquipélago de Shetland é exemplar: pertinho da Noruega, as ilhas pertenciam àquele país, antes da anexação pela Escócia no século 15.
A quarta temporada de Shetland (2018) paga o tributo merecido que o Celtic tem que prestar ao Nordic Noir, através da inclusão de radicais de extrema direita noruegueses. A coisa deve estar fermentando por lá, porque duas recentes séries suecas também ressaltam neonazis/reaças. Tempos sombrios como a belíssima cinematografia gélida e cinzenta desses Noirs nortistas. Se bem que, com a espécie humana no comando, qual tempo não tem sido sombrio?
Acertadamente, a série da BBC manteve o formato adotado na terceira temporada: meia dúzia de episódios dedicados a um só caso, então há pistas falsas e becos sem-saída.
Imediatamente após Thomas Malone ter sido liberto depois de cumprir 23 anos por um assassinato que talvez não tenha cometido, uma jornalista local é encontrada morta no mesmo local e de forma similar ao crime pelo qual Malone fora condenado. Será que foi ele mesmo que estrangulou Lizzie e Sally ou há segredo enterrado na pequena capital de Shetland, Lerwick?
Amo diversos DIs, tipo DI Chandler, DI River, DI Hardy, DI Mathias, sem contar os internacionais que têm funções símiles, mas denominações às vezes distintas, tipo Sara Lund, Saga Norén, Wallander, MartinRohde. São tantos, mas DI Jimmy Perez pode ser meu predileto. Sem nenhum dado externo que lhe confira certa doideira/patologia, Perez é precisamente o sujeito que não tem quase vida fora do trabalho. Deve ser frustrado e faminto sexualmente, porque nas 4 temporadas nem esboço de interesse romântico apresenta; sua vida emocional parece ser inóspita e gelada como a das Shetland. E Douglas Henshall interpreta isso de modo que de vez em quando dá vontade de abraçar DI Perez, apenas porque ele se apoiou numa parede e disse OK.
Não há perspectiva de alegria em Shetland, a série. O sexto capítulo também paga um tributo: a também britânica Broadchurch é uma das grandes séries da década, especialmente sua temporada um e o final de Shetland ensaia rota de colisão com sua colega da ITV. É de despedaçar o coração e molhar os olhos, e quando você acha que a justiça foi feita, o roteiro te joga na fuça que aquilo não é policial procedural pra fazer digestão; aquilo é sombrio.
E enquanto você deixa os créditos finais rolarem, porque ainda não está em condições físico-psicológicas sequer pra segurar o controle-remoto, o narrador da BBC anuncia que Shetland voltará ano que vem pruma quinta temporada. Quem conseguir explicar/nomear a sensação misturada de tristeza, alívio, felicidade, hipnose e êxtase que esse alegre anuncio desperta depois da exaustão emocional do fim, me ajude a compreender o masoquismo de amar tanto um show tão devastador. 

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