Fazia tempo que não rolava dobradinha na seção, né?
Então, vamos de filmes chilenos, ligados não apenas pela nacionalidade, mas
pela questão da paternidade e por estarem no catálogo da Netflix.
As semelhanças acabam aí, porém, porque um é suspense trash, com cena que dá até pra ver a
câmera refletida num quadro, enquanto o segundo é delicado e comovente
comentário sobre a vida após a perda dum filho.
Madre (2017) é a contribuição chilena pras narrativas exploitation, que colocam o estrangeiro/imigrante como ameaça à tradicional família. A América Latina sempre exotizada em filmes euronorteamericanos se vinga, colocando as Filipinas nessa posição. Vingança colonial ou briga de comadres colonial?
Diana está grávida e não dá conta de tantos afazeres,
além de cuidar do agressivo filho autista, nada parecido com os de séries
inclusivas norte-americanas tipo Parenthood e Atypical. Martin parte pra
porrada e cospe sopa quente na fuça da mãe.
Num casual encontro no supermercado, a dona-de-casa
desesperada conhece Luz, que acalma a fúria de Martin. Contratada como babá e
faz-tudo o mais, bem ao estilo latino-americano de relacionamento patroa-empregada, logo Diana começa a suspeitar que está sendo caçada pela
friamente submissa filipina, que insiste em conversar com Martin no idioma de
sua terra natal.
Madre não é nenhuma
obra-prima original, mas tem cheiro de trama de pactos demoníacos da virada dos
60’s até meados dos 70’s. Faltaram grana e roteiro mais azeitado, mas do jeito
que tá, dá pra se divertir, e o final é bem do tipo que geraria e-mails de
advertência, tipo daqueles que contavam que alguém acordara numa banheira cheia
de gelo, mas sem os rins ou fígado ou pleura, quem se importa?
Excomungar-me-ão por colocar Madre ao lado do profundo
e sensível La Memoria del Agua (2015), mas as dobradinhas não se propõem a
equivaler produções.
Javier e Amanda separadamente lidam com o luto pela
morte do filho, até que se encontram após uma nevada, evento favorito do finado
Pedro.
O filme consiste das (inter)ações cotidianas das 2
personagens e provavelmente só agradará aos acostumados a roteiros que não se
baseiam no efeito dominó do drama. Mas, sabemos que tudo é informado pelo
desespero agônico de haver perdido um rebento; segundo muitos, a dor mais
devastadora pela qual pode passar um ser humano. Daí que quando Javier dança
numa discoteca, a música que ouvimos é triste e não o bate-estaca que motiva
seus movimentos. La Memoria del Agua nos chama pra entender o casal e pode ser
lancinante, quando a pobre Amanda inadvertidamente tem que começar a fazer
tradução simultânea duma conferência, onde uma seção descreve como o corpo reage
durante um afogamento.
Elena Anaya e Benjamin
Vicuña estão impecáveis, num filme quieto e brutal, no diálogo final entre o
ex-casal. O argumento de Amanda é duma dor descomunal, mas faz todo o sentido.
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