Ringo, o gato albino e surdo mais meiguinho do mundo
Ele chegou no comecinho de noite em um domingo de setembro de 2010, uma semana antes do meu aniversário. Minhas irmãs o trouxeram escondido no ônibus e no metrô. Para elas, ele também era ela… mas ao chegarem, eu olhei bem aquele pequeno ser que parecia uma bolinha, que se não estivesse tão suja e cheia de pulgas seria branca, e percebi que era um menino.
Quieto, parecia estar com muita fome. Ele estava acompanhando outro gato pela rua quando decidiu entrar na casa delas, algo meio suicida, levando-se em conta que elas têm um pit bull nada amigável com outros animais. Elas o resgataram, esconderam no quarto e me ligaram. Afinal, o que era mais um gato para quem já tinha quatro? E eu não tive como recusar.
Eu o separei dos demais, como ensinam, quando já se tem gatos. O correto é ir introduzindo o novo habitante aos poucos. No dia seguinte, ele já tomou banho no pet shop e passou por uma consulta veterinária. Estava tudo bem, deveria ter uns três meses. Eu o batizei de Ringo, em homenagem ao quarto beatle, Ringo Starr. Ele tem olhos azuis, uma carinha alegre e é estrábico. Aos poucos, ele logo conquistou a amizade do Sting, que havia sido o último adotado (outro dia conto a história dele, que é bem bonita também). Os dois se tornaram inseparáveis, até a chegada do Pelé, que também vale outro perfil aqui.
Voltando ao meu bebê, pois ele sempre será meu bebê, não sei ao certo quando me dei conta de que havia algo estranho com ele. Quando algum som muito alto assustava os outros gatos, ele permanecia igual, só se alterava ao notar a mudança do comportamento dos demais. Quando se usava o aspirador de pó em casa, por exemplo, os gatos todos saíam de perto, exceto ele. Comecei a desconfiar, e fiz uns testes bem caseiros, do tipo gritar bem perto dele. E nada. Assim, descobrimos que Ringo é surdinho. Mais, descobrimos que ele é um gato albino.
E o que são gatos albinos? Explicando de forma bem simples, são gatos totalmente brancos, graças a uma mutação genética, e muitos deles são surdos. Interessante que aqueles que têm olhos de cores diferentes costumam ser surdos apenas do ouvido do lado do olho azul. Eles não podem tomar muito sol, por correrem o risco de desenvolver câncer de pele.
E, adivinhe se Ringo não ama tomar sol?! Sempre preciso ficar atenta, e chego ao extremo do ridículo de não tirá-lo do sol, mas abrir uma sombrinha e criar uma boa proteção sobre ele. E ser surdo não atrapalha a vida dele, aliás, em dias de jogos ou em época de festas de fim de ano, ao contrário dos outros, ele não sofre nada.
Bom, Ringo já é um gatinho especial, certo? Mas não parou por aí. Um dia, estava exatamente como estou agora, escrevendo algo quando senti um movimento forte embaixo da mesa, ao olhar, ele estava se debatendo. Desesperada, notei que estava tendo convulsões, comecei a gritar e minha irmã mais nova, que estava aqui, me ajudou a tirá-lo do chão.
Eu o peguei no colo e desci as escadas do meu prédio correndo, sem caixa de transporte, sem celular, sem bolsa e fui direto para o veterinário, que atendia na mesma rua em que moro. Cheguei lá e falei que achava que ele tinha tido um choque, pois havia fios e tomadas. O rapaz me disse que ele ser epiléptico era menos perigoso que levar um choque. Para eu tomar cuidado.
Dias depois, acordei assustada, sentindo um movimento fora do normal embaixo da minha cama. Achei que alguns gatos estavam brigando, ao olhar, era Ringo tendo outra convulsão, e perto de uma tomada novamente. Eu o tirei do chão imediatamente, o coloquei na cama e fiquei desesperada… era de madrugada. Chorando, falava que ia passar… e passou. No dia seguinte, levei-o na veterinária, que entrara no lugar do rapaz que havia saído. Ela não pode fazer muita coisa, pois, novamente, achava que ele havia cutucado a tomada.
Porém, na terceira vez que ele teve convulsões, descobri que não era por causa de possíveis choques elétricos. Ele estava dormindo na caixa de transporte. A partir deste dia, a veterinária me disse para dar Gardenal, mas que o correto era procurar um veterinário especialista, um neurologista. Fui até à Faculdade de Medicina Veterinária da USP, onde fui muito mal atendida e perdi muito tempo. Conversei com ela que, então, me disse para procurar um dos mais conhecidos da área, que dava aulas e atendia na Faculdade de Medicina Anhembi-Morumbi: João Pedro de Andrade Neto. Consegui agendar e lá fomos nós.
É muito interessante ver como fazem o diagnóstico, com testes e tal, mas, claro, foram pedidos raio X do cérebro e, se fosse possível, uma ressonância magnética. Sendo que este segundo exame, como sabem, é bem caro. Porém, o raio X apontou que havia algo no cérebro do meu bebê, sim. Só que não fazem cirurgias no cérebro de animais, ao menos aqui no Brasil. O que deve ter acontecido a ele é que, ainda bebê, tenham batido na cabecinha dele ou ele mesmo a bateu, mas algo criou uma lesão que está lá, parada, não cresce, não diminui, mas causa as convulsões.
Começamos o tratamento, mas não há muito o que fazer. Ele toma Gardenal até hoje, porém, em doses que foram aumentando durante os anos. Depois, ele começou a ser atendido por outro neurologista da Anhembi-Morumbi, também muito prestigiado, Wagner Sato. Desde então, ele está sobre controle, mas, de tempos em tempos, infelizmente, ele tem convulsões. O que me faz chorar, sempre…
Outro momento que me deixa chateada são as duas vezes por dia em que tenho de dar remédio para ele. Ringo, claro, odeia. Ele tenta se esconder debaixo da cama, baba, me olha como se me perguntasse “por quê?” e eu peço desculpas e digo que o amo muito.
Talvez eu dê mais atenção a ele que aos outros, por motivos óbvios, mas Ringo é tão meiguinho, tão doce, um gato diferente mesmo. Apesar de surdo, ele mia, e muito, e alto… Talvez por não ter noção alguma de sons.
Rotina
Quem tem gato sabe que eles adoram rotina, alguns têm lugares preferidos pela casa, o lado certo de ficar na hora de comer, parecem o Sheldon da série The Big Bang Theory. Por exemplo, todas as noites, quando me sento ou deito no sofá para assistir ao jornal ou outra coisa na televisão, Ringo vem e se deita no meu colo. De vez em quando, estou em pé e ele se esfrega em mim, ou “escala” minhas pernas. Claro que esta última me machuca, mas eu tento resistir, como resisto em me levantar ou me mover para não incomodá-lo quando está colado em mim. Entendedores, entenderão!
Uma coisa que ele faz, e que eu acho muito engraçada, é “montar” nos outros gatos, como se fosse “cruzar”, ele morde a nuca e começa a fazer uns sons engraçados. A veterinária diz que é para mostrar domínio, não é algo sexual. Mas é engraçado de se assistir.
Poderia escrever mais mil coisas sobre meu bebê, que hoje tem oito anos. Ele já é um adulto, quase um idoso na “conta felina”, mas para mim ele é e sempre será “meu bebê”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário