NEM SÓ DA CORRUPÇÃO VIVE A POLÍTICA BRASILEIRA.
José Carlos Sebe Bom Meihy
Para Paulo Pereira
Estamos fartos de ouvir sobre o andamento deste ano como exceção. O curto tempo para as campanhas, espremidas entre a Copa do Mundo e a proximidade da agenda de final de ano, condensou tensões naturais de qualquer processo eleitoral. Os novidadeiros buscam atualizar temas na tentativa de mostrar que muito mais que nas disputas anteriores, certos assuntos respondem ao presente e ao imediato, como se fossem desafios inéditos. Entre tantas pautas, duas merecem cuidados especiais: a corrupção e a falta de perspectivas. Falemos de ambas, tentando uma saída para o panorama geral e para a esperança que precisa ser, mais que nunca, a última que morre.
Certamente, o tema da corrupção é impactante. Manifestação asquerosa da vida social, a contrafação é convite irrecusável à descrença. A ela, aliás, se atribuem dois predicados que, contudo, se suplementam. Ao afirmar que a corrupção é “histórica”, garantem-se duas situações: uma que ela sempre existiu, e que é inerente à condição humana desde os tempos bíblicos; outra que é “sistêmica”, ou seja está instalada culturalmente em todos os setores da vida, sem deixar campo livre. Prefiro esta segunda explicação, pois percebo que a corrupção é parte do sistema de exploração capitalista sem o qual não temos como sobreviver no atual estágio da vida globalizada. Em sociedades em que o progresso e o lucro se fazem faróis que guiam a política, não há como deixar por menos o sentido do lucro. Do lucro à ganância, os passos são mecânicos e apressados. Já a garantia do acompanhamento “histórico” exigiria coerência com a aceitação processual que sempre viu, no caso brasileiro, a implacável emergência do papel das empreiteiras participando das gigantescas obras operadas no país e fora dele. Desde a construção de Brasília, passando pela ditadura - que até o presente não revela suas contas, deixando assim odor desconfiado -, seguindo dos governos da abertura democrática até as decepcionantes mostras do petismo, aceita-se com mais lógica a constatação da corrupção moderna, recente e desafiante. A abordagem desse mal, contudo, carrega mais enigmas do que se pensa. Não é segredo que ela existe aqui ou alhures. Em países progressistas economicamente e com economias consolidadas, como Estados Unidos, Japão ou Reino Unido, ela existe e se expressa com a mesma sordidez. O caso da América Latina assusta pela proximidade, e assim vemos sem surpresa o que se passa na Argentina, Peru, México. Há alentos, é verdade, e nessa linha o Chile a Colômbia se apresentam na vizinhança. Em termos oficiais, é bom que se reconheça, ocupamos o 96º lugar entre 180 países segundo a Transparência Internacional, no mesmo nível, portanto, da Índia, China e Kuwait que se apresentam como fenômenos de emergência e superação de passados de penúria.
A abordagem da corrupção merece outras companhias, pois não é a única senhora dona do caos que vivemos. Sou daqueles que creditam à inexperiência eleitoral a grande razão de nossa vacilaria político-eleitoral. É lógico que não concordo com a frase infeliz pronunciada por Pelé em 1972, quando em defesa da ditadura dizia que “povo não sabe votar”. Em correção, garanto que povo não pôde manter o aprendizado por ter um espaço de 21 anos de ditadura onde o voto livre e universal tinha regras exclusivas dadas aos chamados colégios, sem participação popular. Desde então, os direitos têm sido exercitados com titubeios de aprendizado. Não há, contudo, regime melhor que o democrático. É nesse sentido que se advoga o direito de todos. E temos que aprender custe o que custar. No cenário presente, devemos destacar a indigência dos argumentos mais expostos. Há aqueles que defendem o não diálogo e a ordem imposta à bala, à castração química de estupradores, à pena de morte, à militarização das escolas, ao fechamento das fronteiras e, claramente, são contrários ao direito de equiparação das mulheres aos homens e a todas as diferenças, em particular contra os negros e homossexuais. Isso, porém, por sofrido que seja, é legítimo num espaço de discussão pública. Vai da maioria do eleitorado querer ou não. O que se torna difícil, é admitir que os contrários não têm se contraposto com programas minimamente sólidos, baseados em princípios e compromissos partidários coerentes. O que temos no plantel disponível é uma individualização dos candidatos. Cada um falando por si, e poucos replicam os mandos arbitrários que sim estão mais claramente colocados. Nessa perspectiva, os debates não têm servido para muita coisa. Aberrações como o Pastor-Cabo-candidato oferece a sugestiva URSAL (União das Repúblicas Socialistas da América Latina) como tópico de debate ganham proeminência. Em complemento, uma ladainha de promessas sem cabimento se alinha às falas que se esgotam em números estatísticos e promessas desarticuladas. Mas é o que temos... É exatamente sobre o vazio de propostas e ideias que haveremos que decidir. Decidir e pagar para ver. Dói dizer que não temos outro caminho, e que caminhando, mesmo com eventuais tombos, haveremos de aprender a dura lição da democracia. Estamos juntos. Estamos? Vejamos...