UM MUNDO SEM CELULARES: riscos da Nomophobia
José Carlos Sebe Bom Meihy
Muito se tem falado sobre avanços da medicina e não são poucos os que se encantam como a chamada robótica médica. A tecnologia empregada a favor das ciências tem produzido milagres surpreendentes. Basta termos alguém que necessite de amparo clínico para que se note os passos grandes dados em favor de bons diagnósticos, monitoramentos precisos e possibilidades ampliadas de recuperação. Uma coisa leva a outra e o mesmo se diz do aparato eletrônico empregado em escalas crescentes também em outras áreas como nos serviços domésticos, nas atividades de recreação e esportes. É claro que temos que saudar a tecnologia como virtude, mas, exatamente para que se a legitime como conquista é de se considerar também seu avesso, ou seja, os malefícios que pode produzir. É aí que a medicina volta a significar.
Como mercadoria, os celulares têm cumprido a tarefa de democratizar a comunicação em geral e, nessa linha, os preços a cada dia mais acessíveis facilitam contatos e podem promover aproximações variadas. Assim, progressivamente somando possibilidades, de tal forma os celulares se tornaram usáveis que não se consegue pensar o mundo sem eles. Os tais aparelhinhos, por sua vez, sorrateiramente se integraram no cotidiano como se fossem órgãos ou componentes inerentes ao nosso corpo. “São como parte da gente”, há quem diga. Dia desses, ouvi uma colega dizer, sem muito pudor, que sem o celular, esquecido em casa, ela se sentia como que mastectomizada. Fiquei chocado, quis explorar mais a figura de linguagem empregada e de volta ouvi algo ainda mais estarrecedor “ué, com você não é assim? Se fosse homem, sem celular eu me sentiria capado”. Calei. Não respondi... Não respondi, mas levei para pensar.
Não há dúvidas que o mundo ficou inimaginável sem os tais dispositivos eletrônicos. A existência de um profícuo ramo de negócios voltados a isso nem mais espanta. Onde quer que se vá, lá estão pessoas “passando o tempo” com as telinhas brilhantes, iluminadas e latejantes. Seja no metrô, ônibus, no mercado ou nos consultórios, é imediato constatar pessoas entretidas, mergulhadas em informações e contatos. Parece feitiço... Confesso que já vi pessoas em igrejas, cemitérios, teatro e cinemas como os equipamentos em funcionamento sem nenhum constrangimento. Nas escolas o celular virou tema de conflitos entre professores e alunos, e a linha divisória entre poder ou não ingressar com esses aparelhos tornou-se objeto de pesquisas educacionais e muita discussão. Dentre tantas experiências recentes, uma me impactou bastante. Indo para a Universidade de Stanford, na Califórnia, entre as mais reputadas do mundo, fiquei pasmado em saber que os alunos não podem usar máquinas – celulares ou computadores – durante as aulas regulares, em muitos cursos. Nem mesmo para as tais consultas suplementares ou para registros e anotações são permitidas tais presenças que, segundo explicações competentes, se formulam como forma de derivação da concentração.
Pois é, o grau de gravidade da situação tornou-se tamanho que o fenômeno virou doença já descrita por especialistas. Sob o nome de Nomophobia, termo derivado de no-mobile-phobia, ou seja, pavor de ficar sem acesso às redes sociais e à comunicação imediata, a situação já é tratada como doença. Os dramáticos efeitos são próximos da conhecida síndrome de pânico, e decorrem de casos corriqueiros como a falta de energia elétrica, pane no aparelho ou mesmo o prosaico fim das cargas de baterias ou dos vazios de cobertura. De modo geral, nosso cérebro vai ficando dependente a tal ponto que há pessoas que acordam a noite com a sensação irresistível de verificar o que chegou. Sabe-se de casos de tipos que ouvem sinais de chamada mesmo quando o aparelho não está ativado. De tal forma a privação eletrônica se manifesta que as crises de ansiedade levam a depressão mais ou menos prolongada, fato que ameaça a vulgarização desses casos tidos já como epidêmicos. Em conjunto, a expressão desses tiques se constitui no que tem sido reconhecido com “Reação FOMO” (Fear of missing out) ou, em tradução livre: medo de estar perdendo algo. O pior é que tudo tende a se agravar posto que ao mesmo tempo em que se diagnosticam casos e se descrevem detalhes dessa manifestação, novos avanços colocam no mercado de consumo aparelhos cada vez mais sofisticados. O grande paradoxo notado, porém, é que exatamente a medicina, uma das áreas mais beneficiadas pela eletrônica é ela mesma a denunciadora de malefícios. Médicos atentos ao agravamento da situação já prenunciam que as doenças nomofóbicas serão o mal do século XXI. Temendo, desliguei o meu aparelho... Vou ficar assim uns quinze minutos. Depois conto o resultado.
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