Roberto Rillo Bíscaro
O País Basco fica no frio norte espanhol e parte de sua
nacionalista população usa o idioma basco. É nele em que é falado Flores
(2014), um daqueles muitos filmes escondidinhos nos recônditos da Netflix e que
merecia muito mais divulgação.
Numa cinzenta, chuvosa e fria cidade não identificada,
Ana recebe diagnóstico de menopausa precoce. Em um casamento gélido e emprego
discreto, a quieta mulher não tem muito a comemorar. Até que começa a receber
flores religiosamente, em certo dia da semana.
Essa nova rotina que começa a iluminar a vida de Ana e
enfurecer seu marido sofre abrupto corte na narrativa pra nos apresentar outro
núcleo familiar. Beñat é casado com Lourdes, que trabalha num pedágio. O
discreto operador de guindaste vive no fogo cruzado entre esposa e mãe, Tere.
É só o espectador ter um pouquinho de paciência que essas
duas tramas se intercruzarão numa melancólica meditação sobre o esquecimento e
sobre suas perdas e ganhos.
O diretor/roteirista Jon Garaño usa as flores como ícones
que assumem distintos papeis de acordo com cada situação, etapa da história
(que transcorre em cinco anos) e personagem. Flores é maduro, sentimental,
lento, quieto. Não há fanfarras ou edulcorantes: a vida é fluxo, memórias
esmaecem, lembranças e convicções são convenientes pelo tempo que nos servem
pra viver.
Estritamente em nível pessoal, Flores dá pontadinha no
passado ignoto da ditadura franquista, através dum comentário pela TV, que
justamente questiona se convém deixar pra trás as agruras de então, ou seguir
lembrando das barbáries do Coiso espanhol, através dos julgamentos e punições
ainda em curso.
Flores é essencialmente feminino, posto o impacto de
diferentes relações com esses vegetais ser sentido nas vidas de três delas, interpretadas
com certidão.
Óbvio que qualquer um poderá se empatizar, mas quem já
sofreu perda e consegue avaliar os malabarismos emocionais que faz pra manter
certa sanidade, se encantará e até verterá lagrimazinha.
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