Roberto Rillo Bíscaro
Despertar empatia é um dos desafios dos realizadores de
filmes cujas tramas se desenrolam primariamente em telas de
computador/smartphones/smartTVs. A ação passa a ser terceirizada, porque se
trata de uma câmara filmando uma câmara filmando. Acresce que o tempo
digitando, a necessidade de se ler muitos textos em caixas de mensagem e o
imperativo de se exibir programas/vídeos carregando, dilui a ação, e, portanto,
a tensão.
O roteirista e diretor estreante Aneesh Chaganty
contornou esse problema com seu competente Searching (2018), que no Brasil foi
literalmente traduzido como Buscando... Com elenco competente e ação se
passando apenas em telas, Searching é sobre uma busca e o título funciona em
nível duplo: o pai procurando a filha desaparecida e seu uso de ferramentas
online pra fazê-lo.
Searching abre com sequência emocionante e muito bem montada
sobre como a esposa de David Kim falece de câncer. Prestando atenção, você
perceberá até o capricho de se preocupar em mostrar como as próprias páginas
mudam no espaço de dois anos.
Como a maioria dos pais, David pensa que conhece sua
filha Margot como a palma da mão, apenas porque troca mensagens com ela o tempo
todo. Quando ela some, novas facetas se descortinam e o nipo-americano descobre
muita coisa, tudo pela internet.
A proposta de foco narrativo de Buscando...é que
assumamos o ponto de vista de David, olhando/lendo as telas, vídeos e
comentários que ele vê/lê. Chaganty não consegue aderência total a esse
parâmetro tão rígido e cenas de reportagens televisivas, por exemplo, dão
impressão dum narrador onisciente. Isso nem de longe azeda o longa, porque o
diretor consegue que fiquemos realmente engajados com a dor de David e curiosos
pelo que houve com Margot.
Searching comenta sobre a superficialidade real de
relacionamentos que aparentam profundidade, além das pontadas na
espetacularização da tragédia, agigantada pela internet. Então, sequente ao
desaparecimento de Margot, aparecem os haters,
teóricos da conspiração e aproveitadores em geral. Esse não é o fulcro, mas
Searching não deixa de notar esses fenômenos, dos quais, aliás, depende pra
existir.
Como todo bom suspense, Searching tem reviravolta na
trama e final até bem surpreendente, que lembrará os mais antenados, de certa
série britânica muito influente desta década.
Pra quem não enxerga
direito, esse crescente sub-subgênero de filmes dentro de telinhas pode ser
irritante/frustrante. Um martírio/saco ter que ler tantos chats, mas em
Searching isso vale a pena, até porque não há tantos assim. E acho que mesmo
não lendo, dá pra entender igual. Afinal, é só mais uma história de menina que
some, embora muito bem contada e urdida.
Formalmente interessante, Amizade Desfeita deixa a
desejar no quesito provocar terror, conforme apontei na resenha, que você lê aqui.
Este ano saiu Unfriended: Dark Web, que não continua a
história de seu predecessor, mas tenta aterrorizar com a internet na qual a
maioria de nós não sabe navegar e por isso tem fama de do mal; espécie de
versão cibernética do inferno.
Conforme previ, o visual do Unfriended original já está
datado, porque a internet muda em par de anos. O que não alterou é que a nova
vinda de Amizade Desfeita segue sem engajar o espectador emocionalmente: aquela
meninada boba fala sem parar e não dá pra se importar com eles de jeito nenhum.
Mas, depois dalguns minutos, ocorreu-me epifania, que me
fez desligar o filme imediatamente. Claro que muito texto escrito aparece em
filmes onde a ação se passa nas telas de computador. Assim, o interminável
matraquear nas janelinhas do Messenger do Facebook ocupa muito tempo.
Os produtores sequer se
deram ao trabalho de ampliar as tais janelinhas, então tinha que me aproximar
pra lê-las até que veio o clique: esses malditos não me incluiram nesse mundo
ficcional, não me querem nele: que vão pras profundezas do inferno cibernético
então. E desliguei o vídeo na hora. Se ainda tivessem conseguido me cativar, vá
lá, mas só pedir, sem nada me oferecer em troca, já era, baby dearie.
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