Nos 80’s, falava-se nas cantoras britânicas branquelas
que tinham vozes fortes, geralmente associadas a negras. Helen Terry e Alison
Moyet são as mais cotadas. Curiosa, mas não acidentalmente, a negra Jaki Graham
teve apenas sucesso comercial moderado com os três álbuns lançados pela EMI, na
década.
Nascida em Birmingham, em 1956, Graham sempre foi
admirada entre os pares pela voz quente, mas nunca esteve nos topos das
paradas, embora tenha tido canções populares na Europa, Ásia, Oceania e até na
parada dance da Billboard. Como nunca
foi de massa, seu nome é (quase) nunca lembrado nos revivalismos oitentistas.
A britânica jamais parou de fazer shows, mas raramente
lançava material, até que dia 6 de julho, surgiu When A Woman Loves, pela JNT
Music. A miudeza da gravadora não precisa afugentar: descobri o álbum, via
Spotify.
Nos idos dos 80’s, ainda adolescentes ou com meros vinte
e poucos anos, cantávamos com Kylie Minogue sobre os “old days/remember the
O’Jays”. Era puro boca pra fora, porque tanto nós, quanto ela, não vivêramos a
época idealizada pela letra dos então já velhuscos Stock, Aitken and Waterman. Agora
chegou nossa vez e de Jaki Graham, de rememorar o tempo da juventude há tanto
pra trás. As 14 faixas são totalmente oitentistas, felizmente sem os excessos
de bateria eletrônica e tecladeira que deixam tão datado tanto do de então.
E é esse saudosismo oitentista que entrega a maior
delícia do álbum: o irremediavelmente dançante disco-funk Get It Right. A letra
fala sobre retornar aos bons tempos do decênio, quando todas canções eram tão
maravilhosas. “Do you remember? I remember.” Outra faixa que celebra a década e
voltar a festar é o charm All Night
Long (1985); quero ver oitentistas resistirem a dar uns passinhos.
When a Woman Loves remete o tempo todo a tempos há muito
escorridos. É o electrosoul midtempo
da faixa-título; são os urban souls
de News For You e Stop the Ride (super Steve Wonder fase 80s, com gaita e
tudo); ou as baladas, como Through the Rain, Someone Like You, Song For Me e
Ready For Love. O álbum é tão encharcado do espírito do auge de Jaki, que
Leftover Tears soa como os anos oitenta faziam música inspirada no soul
deslizante do final dos 60’s. Tem pop soul dançável, como Sometimes e R’n’B
domesticado, como em Eye To Eye e sua guitarrinha blues.
Muito
bem cantado e produzido, When a Woman Loves não revolverá a carreira de Jaki
Graham, mas agradará em cheio quem jamais superará a magia dos anos 80.
Meli'sa Morgan também não foi sucesso de lotar estádios,
durante seu período mais fértil: anos 80 até o meio dos 90s. Seja solo, seja
com grupos como o High Fashion, a nova-iorquina entrou apenas uma vez na Hot
100, da Billboard, embora tenha frequentado paradas dance, adult contemporary
e R’n’B, ou seja, sempre foi conhecida em nichos.
Pena, porque sua voz é incrível e a técnica impecável. Além
de ter cantado com grandes como Whitney Houston e Chaka Khan, Morgan estudou na
Juliard. Ouça a qualidade dessa cover de Prince, de 1985.
Há 13 anos sem lançar, o silêncio felizmente foi quebrado
dia 13 de julho, com Love Demands, álbum que saiu pela Goldenlane Records,
pequenina, mas está no Spotify, então não há muito como alegar inacessibilidade.
Love Demands está matematicamente dividido em meia dúzia
de números com clima oldie, bem anos
50 e 60 e outras seis faixas com sabor bem mais moderno, quase contemporâneas.
A metade oldie
é a primeira. Tem R’n’B, com madrigal vocal arrasante (How Can You Mend a
Broken Heart); blues (Never Loved a Man), delícia deslizante à Motown (Love Is
Here and Now You’re Gone) e baladas meio cinquentistas R’n’B (I’ve Been Loving
You Too Long e Nothing Can Change This Love). Há o clima reggae de It’s Not
Unusual. Tudo com vocais irretocáveis.
Daí entra a parte moderna, com material inédito e até
participação de rapper na melódica The Only One. Os climas de perigo e urgência
hip hop são referenciados de leve em repetitivas batidas, como em Holla e
Decisions. Mas é tudo bem mansinho, como também a infiltração trap no arranjo de No More, a vibe mais contemporânea de Love Demands.
É essa parte que contém a mais sem-gracinha do álbum,
Can’t Explain. E isso é muito sintomático, quando se parte do princípio de que
este resenhista é um senhor cinquentão, moderninho até, mas mais próximo de
gostar da sonoridade da parte vintage. Por
ser blogueiro e não necessitar fingir imparcialidade, posso reconhecer que
percebo Love Demands como bom álbum, no atacado, mas só ouço até a sexta
canção. Também não creio que os millenials
curtirão a parte tencionando ser moderninha, por ser tépida demais.
Desse
modo, Love Demands é honorável esforço, muito bem feito, mas que não satisfará
ninguém 100%.
Nenhum comentário:
Postar um comentário