quinta-feira, 29 de novembro de 2018

TELONA QUENTE 264

Roberto Rillo Bíscaro

Não cultuo Winston Churchill e acho sacais as representações do relacionamento dele com a esposa, sempre a paciente estoica, que o coloca na linha, quando necessário, na vibe “atrás de um grande homem”. Metido a entender de tudo, de política a pintura e literatura, o estadista é reverenciado frequentemente como o britânico mais importante de todos os tempos e é compreensível pelo papel que teve como líder durante os duros anos da Segunda Guerra.
Meio como Lear ou Hamlet, a personagem Churchill tem sido objeto de desejo de diversos atores. Amados mios, como John LIthgow e Albert Finney interpretaram o charutudo. Quando soube que Brian Cox o fez em Churchill (2017), tive que vê-lo. Não me arrependo: pra quem curte dramas históricos bem dialogados, padrão britânico pra exportação, o filme acerta em cheio. Se havia samba-exaltação, deveria haver a categoria filme-exaltação e Churchill é desse tipo.
O título é bem pouco criativo e representativo, porém. Passa a impressão de cinebiografia abarcante de toda vida ou grande pedaço dela; do processo de formação dum ícone ou coisa assim. Nada disso, Churchill recorta menos de uma semana na vida do Primeiro-Ministro.
Hoje, sabemos que a Operação Overlord foi decisiva pra derrota alemã. Ela teve início com o desembarque dos Aliados nas praias da Normandia, em 6 de junho de 1944, o “Dia D”. Mais de 1 milhão de soldados entraram no território francês ocupado pelos nazistas, em ataque anfíbio. O ancião Sir Winston Churchill descria do plano, baseado em suas experiências da Primeira Guerra, décadas atrás, em um outro mundo.
Churchill é sobre obsolescência e como encará-la com dignidade dolorida. Mais jovens, como Eisenhower, entendem melhor o mundo novo, por isso assumem o controle das operações. E aí reside ponto fulcral que o roteiro não aborda, mas está subentendido: a obsolescência não é apenas a do chefe do governo inglês, mas da própria Inglaterra. Os norte-americanos apenas informam os britânicos sobre os planos pra operação e estes, na figura do general Montgomery, os colocam em ação. Nesse mundo novo, a Europa era segundo escalão.
Brian Cox treme o queixo, expele fumaça pelas narinas feito fumarola, faz um sotaque perfeito e tem até um ou dois momentos de solilóquio shakespeariano: os velhos do Bardo conjuram deuses e bruxas, o pio Churchill reza pedindo que o clima impeça a operação. Muito épico, com fundo musical coral e tudo.

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