Roberto Rillo Bíscaro
Até hoje, não consigo ver cabides de arame sem me lembrar
da antAlógica cena em que Fae Dunaway, interpretando Joan Crawford, espanca sua
filha Christina, no exagerado Mamãezinha Querida (1981). Ao longo das décadas,
lixos assim ou como o pavoroso Diana (2013), desavergonhadamente
inventam/especulam sobre vidas de celebridades mortas, e, portanto, incapazes
de dar sua versão dos fatos. Esses filmes facilmente passam a se constituir
como versões oficiais dos fatos. Apareceu na tela (qualquer que seja), é
verdade.
Várias dessas produções divertem, porque são tão ruins e
é por isso que amo assisti-las. Escolho não acreditar em nada que vejo e
mergulho no mar de lixo-luxo. Só mesmo com essa atitude pra “defender” Grace de
Mônaco (2014), que eu sequer sabia da existência antes de trombar com no
catálogo da Netflix.
Em 1956, a atriz norte-americana Grace Kelly realizou o
sonho conto-fadista do século XX: uma plebeia se casar com um príncipe, no
caso, o de Mônaco. Diana era lady, há anos, ao se casar com Charles; sua
família mais antiga e inglesa que a do marido; ao passo que Kelly era filha de
novo rico ianque. Claro, ambas tinham grana.
Grace de Mônaco retrata a transformação de Grace Kelly em
Grace de Mônaco. É meio como um The Crown pro canal Lifetime (aliás, única TV
norte-americana que aceitou exibir o filme): a atriz tem que sacrificar sua
individualidade, mas ao fazê-lo – ao contrário da série britânica - tornar-se-á a monarca monegasca e cumprir sua missão
histórica de conduzir seu povo, salvar seu país através de sua individualidade.
Dito assim, parece conceito muito esperto de subversões, mas não é; é uma
bobeira.
Como a realidade foi bem menos heroica que o necessário
pra esse tipo de narrativa, o roteiro quer que acreditemos que seis anos após
seu casório, Grace ainda não se adaptara ou aprendera a complexa etiqueta da
realeza. Quando uma crise entre Mônaco e o General De Gaulle põe em xeque a
existência do principado (mentira, foi tudo bem mais suave!), Grace mostra a
que veio. Recorre à ajuda de Derek Jacobi pra aprender a ser princesa (tão
vendo, porque amo esses filmes?) e à Hitchcock desvenda trama palaciana e vira
ícone em um discurso num evento de gala da Cruz Vermelha. Em meia dúzia de
anos, ela não conseguira perceber o que o conde ou sei lá quem, a ensina em
dias? Que droga de atriz não observadora era essa?
Exceto pelo figurino, é tudo deliciosamente tolo. Nicole
Kidman recebe cada close-up de surtar Norma Desmond; Tim Roth fuma
desesperadamente com mãos expressionistas; os sotaques são de teatro de
segunda; tem governanta à de Rebecca (Hitchcock, darling); Derek Jacobi tem um
papagaio e o roteiro até “explica” como Grace faleceu. Quando ela ficava brava,
subia as colinas pra casa dirigindo feito louca. Mais velhos lembrarão que ela
morreu, porque despencou dum desses penhascos, então, o propósito da cena é
óbvio. Mas, na verdade, ela teve um AVC, por isso, perdeu o controle e voou pra
baixo. Pelo menos, essa é a versão oficial... É muito mais glam imaginar como
Grace de Mônaco nos induz, pra ser sincero, gente!
É muito ruim, recomendo
demais!
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