Em 1979, o vocalista/tecladista Gary Daly e o guitarrista
Eddie Lundon formaram o China Crisis. Como eram dos arredores de Liverpool,
assim como o OMD, Echo & The Bunnymen e A Flock Of Seagulls, a imprensa
musical inventou uma espécie de cena, que jamais houve. Eram (hmmmm, são,
porque todas ainda existem) propostas diferentes.
Com formação flutuante, o China Crisis (CC) não passou de
sucesso mediano: a colocação mais alta nas paradas britânicas de álbuns/singles
não passou de oitavo e isso se repetiu no resto do mundo com dinheiro pra
consumir, dos anos 80.
Gary e Eddie descontinuaram o CC, em 1995, mas faziam
ocasional show aqui e acolá; de vez em muito quando, até nos EUA e mais
frequentemente naqueles lugares sedentos por velharias 80’s, tipo Filipinas.
Não me recordo de China Crisis nas FMs do sertanejo oeste
paulista, na minha década favorita. Pelo menos não de 83 pra frente, quando
obtive acesso a essa frequência modulada. Conheci-os na era do Youtube, quando
me inteirei de delícias ora amadas como Nowhere Girl, do ainda mais obscuro B Movie. CC não me convenceu, ouvi diversas faixas e me soaram sem sal, com
alguns maneirismos de produção superfaceless, daí não tentei mais.
Os algoritmos do Spotify perceberam que pesquiso e escuto
bastante coisa relacionada aos 80’s e há algumas semanas sugeriram-me
lançamento do China Crisis. Constava que Autumn in the Neighbourhood fora
lançado ano passado. Como sempre dou chance a oitentistas, aventurei-me na
primeira canção e a sonoridade estava bem mais orgânica, acústica, sem aquele
verniz genérico de quando quiseram ser New Wave.
Dois ou três trechos mais e já baixava pra ouvir offline,
enquanto procurava por informações sobre. Confiar em data do Spotify é como
crer em promessa de campanha: Autumn in the Neighbourhood saíra em junho de
2015! Como o Swing Out Sister, Daly e Lundon recorreram à vaquinha no
PledgeMusic para produzir as onze faixas.
Eliminadas as camadas de teclados despersonalizados e a
bateria eletrônica artificial, Autumn In The Neighbourhood ficou uma delicinha
naquela vibe adult contemporary.
Smile começa os trabalhos com arremedo de música
“clássica”, que me remeteu imediatamente à versão extended de Since Yesterday,
do Strawberry Switchblade, antes de se transformar numa espécie de New Wave
semiacústica, composta por quem ouviu muito Ashes To Ashes, quando adolescente.
E é também em clima New Wave, mas em registro mais midtempo, que termina o
álbum. Quem ouvia FM no início dos 80’s, não terá objeção alguma.
Cheio de melodias lindas, o China Crisis compôs um álbum
integralmente agradável. Quem curte Prefab Sprout encantar-se-á com Down Here
On Earth, mas aposto que muito devoto de Burt Bacharach não resistirá ao charme
easy listening de Fool. Totalmente Tears For Fears, encarnação Advice to the
Young at Heart, até com guitarrazinha soft rock.
Easy = fácil. Assim é tudo, independentemente das
inflexões. A faixa-título, Being In Love e Bernard incursionam pelo blue-eyed soul. Essa última tem até coro
de menina fazendo papapapa; assim não guento!
Because My Heart tem guitarrinha country, que também
assombra a maior parte da longa introdução de Tell Tale Signs. Wonderful New
World passeia bem pelo gosto do indie rock atual, que pode ser apreciada por
certos fãs de Belle And Sebastian (sonicamente, não em termos de letra, claro).
Joy And the Spark é tão balada oitentista que tem até discreto saxofone,
instrumento-símbolo da década. My Sweet Delight faz jus ao nome, com seu
delicado clima de valsinha folk, com acordeão e tudo.
Quem diria que o China
Crisis me conquistaria apenas em sua encarnação século XXI? Pra ver como os
anos 1980 recusam-se a morrer.
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