Roberto Rillo Bíscaro
Ken Bruen é prosista policial nascido na Irlanda, cuja
produção impressiona pela quantidade. São várias séries protagonizadas por
distintos detetives e policiais. Um deles é o ex-guarda Jack Taylor, cujas
aventuras em livro ganharam adição, em 2017, com o lançamento de The Ghosts Of
Galway.
Galway é a cidade de cerca de 80 mil habitantes, onde se
passa a maior parte das aventuras de Taylor, se bem que algumas cenas dalguns
episódios da série irlandesa Jack Taylor foram gravadas na Alemanha, porque a
TV3 a coproduziu com parceiros germânicos. Desde 2010, 9 filmes de cerca de 90
min. cada foram produzidos e estão na Netflix.
Afastado da guarda municipal de Galway por haver se
metido com figurão político, Taylor é malquisto pela força policial local,
apesar de resolver os casos que essa não consegue, quando contratado por
clientes insatisfeitos com os resultados policiais. Conforme avançam os
episódios, não dá pra evitar de pensar que a animosidade para com Jack chega a
ser quase gratuita, apenas mais uma convenção ou arbitrariedade do roteiro pra
garantir estatuto noir à personagem.
Jack Taylor é praticamente protótipo do detetive durão
noir, beberrão e sempre apanhando, mas que tem bom coração, apesar de
autocentrado e atormentado. O aspecto cartoonish
é dolorosamente evidenciado pela vestimenta. Ao ser expulso da polícia,
Taylor mantem o casacão azul-marinho do uniforme e o usa em todos os episódios.
Personagem de quadrinhos e desenhos é que vestem a mesma roupa eternamente. Na
série, mesmo após anos do rompimento entre Jack e a polícia, o casaco parece
ainda OK.
Iain Glen afirmou
mais de uma vez que o divertido em interpretar Jack Taylor é poder soltar seu
lado Scarface ou Clint Eastwood. Tudo muito bem, mas sua interpretação meio
declamatória e enfática, além do vozão grave murmurante, podem resultar em
overdose de teatralidade, junto com todo o resto de clichês. Fãs demais de
Downton Abbey e Game Of Thrones poderão se interessar ao saber que Glen é Sir
Richard Carlisle na primeira e Ser Jorah Mormont, na segunda. O ator é bom e
Jack é gostável, mas enjoa se consumido seguidamente de perto.
Progressivamente os episódios tornam-se mais sombrios,
especialmente porque aos casos somam-se as muitas desventuras de Jack Taylor e
dos azarados que cruzam seu caminho.
Não desgostei, mas
igualmente não posso recomendar, porque Jack Taylor é por demais genérico. Fãs
completistas de qualquer coisa noir ou obcecados por qualquer coisa Downton/GoT
são as únicas criaturas pras quais eu indicaria.
Mais interessantes, porém, mais difícil de ver, porque fora da Netflix, são as curtas quatro temporadas de Single-Handed. A RTÉ One produziu seis histórias, divididas em temporadas de dois capítulos, cada (exceto a última), que foram ao ar entre 2007 e 2010.
Ambientada na linda, mas meio desoladora costa atlântica
da Irlanda, Single-Handed foca no policial Jack Driscoll, que retorna à
cidadezinha natal e, além dos crimes, tem que enfrentar fantasmas familiares,
especialmente conjurados pelo pai, ex-policial não de todo honesto. No fundo,
Single-Handed é o confronto de duas Irlandas: aquela do passado, pobre,
corrupta e cheia de abusos contra crianças e fracos e uma do presente, que quer
se livrar dessas práticas. Embora as histórias sejam independentes, é útil ver
a série em ordem e na íntegra, porque o último episódio revelará se Jack
consegue se libertar totalmente das práticas do pai/da velha Irlanda.
Assim como historiadores de slasher films apontam Black Christmas como precursor do subgênero, cronistas atentos anotariam
Single-Handed como Celtic Noir avant la lettre. Ou terão que dizer que mesmo
sem o Nordic Noir, o clima de séries como Hinterland (tem na Netflix) e
Shetland prenuncia-se na produção irlandesa. Quando da primeira temporada,
Forbrydelsen mal fora ao ar em sua nativa Dinamarca, mas o policial irlandês já
apresenta os céus carregados e o prevalente clima depressivo da miséria humana,
que se tornaria tão em moda nos anos vindouros.
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