Dedicado à memória de Steven Young, falecido em 13 de
julho, de 2016
Roberto Rillo Bíscaro
Em 1987, uma canção mudou o rumo da música pop. Parece
exagero de saudosista 80’s, mas não é. Pump Up the Volume, constituída
basicamente por samples de inúmeras canções e falação sobre base hip hop,
cravou primeiro lugar na parada britânica e quase conseguiu entrar no Top Ten
ianque. Isso por si só seria um feito, dada à impenetrabilidade norte-americana
pro alternativo.
Pump Up the Volume era música feita por e pra DJs, pra
clubes hipsters e desafiava o conceito de autoria. Hoje é segunda natureza
surrupiar trechos de qualquer coisa pra compor qualquer coisa, mas há três
décadas as gravadoras ainda tinham poder sacrossanto sobre direitos autorais.
Além disso, o single marcou a chegada do independente selo 4AD ao cume do Top
Ten. A gravadora dos etéreos Cocteau Twins batendo majors como Rick Astley e
até Wacko Jacko. Até nos rincões do conservador noroeste paulista dançávamos ao
som de M/A/R/R/S, nome dos anônimos compositores da canção, até nisso
precursores. Hoje é tão comum nomes de artistas que nem sabemos quem são, com
grafias ingrafáveis.
O fundamental M/A/R/R/S foi
evento único constituído por duas bandas da 4AD, que provavelmente não constarão
nem no rodapé dos futuros volumes de história da música pop: AR Kane e
Colourbox.
O Colourbox foi formado em 1982, pelos irmãos Steve e
Martyn Young, e sua cantora “clássica” é Lorita Grahame, que entrou em 83 e é a
voz das gravações mais conhecidas. Até 87, lançaram esparsos singles, EPs e um
par de álbuns, nunca obtendo sucesso de massa. O trio é cult desde a época em que atuou, mas agora o acesso é facilitado
pelo Spotify, que tem praticamente tudo. Escolhi o álbum homônimo de 1985, a
versão com 14 faixas, porque no serviço há umas duas bem mais vitaminadas. Na
verdade, essa já é maiorzinha, porque o álbum original possuía uma dezena de
canções e chegou ao topo da parada indie.
O underground tem servido de farto pasto pro mainstream,
que o digam Bowie e Madonna, sempre antenados pra transformar o alternativo em
mais palatável pra consumo maior. A batida alucinada de Punch e Manic, que
viraria estouro de sucesso até nas paradas da Billboard, já estava dada pelo
Colourbox, em 85. Compare as locomotivas do álbum de estreia de Taylor Dayne,
que entrariam até pra trilha de novela global, com essas duas canções dos
britânicos: as estruturas rítmicas de percussão e linhas de teclado são
similares, parte de uma estrutura de sentido muito comum mais pro final da
década.
Desde que ouvi pela primeira vez – no fim do século
passado, creio – formulei teoria pro fracasso do Colourbox em se popularizar.
Ou foi problema de divulgação da 4AD ou o que pra mim é mais provável: a
produção não é tão bombástica, quanto à do mainstream da época; o som parece
meio “distanciado’, tem hora que parece vir d’outra dimensão. Novamente, evoco
a comparação com Dayne, digamos Tell It To My Heart e/ou Prove Your Love para
notar como a sonoridade é diferente. O Coloubox soaria algo interplanetário pro
ouvinte apenas do Top Ten.
Repertório não deve ter sido empecilho pra popularidade,
porque é acessível e eclético (alguns dirão que até demais). Tem reggae/dub
(Say You e Hipnition), balada à anos 50 (The Moon Is Blue), balada pop à anos
80 (Arena e Arena II), eletrosoul (Inside Informer), puro pop (Suspicion) e até
Motown, na cover de You Keep Me Hanging On, das Supremes. Kim Wilde também
regravaria o clássico, em 1986. Ouça as duas em seguida e veja como a do
Colourbox é mais “esparsa” Isso não significa melhor, apenas diferente. Amo Kim
Wilde e Taylor Dayne.
E como boa parte do M/A/R/R/S estava no Coloubor, claro
haver precursora de Pump Up the Volume. Just Give’m Whisky é uma espécie de
cavalgada spaghetti punk, cheia de samples de filmes de velho oeste e séries
obscuras, como The Prisoner (you are number six!) e até solo de guitarra. O repertório
é tão diversificado que abre com instrumental em piano elétrico, que parece
anunciar um álbum dalgum de seus companheiros mais etéreos de 4AD.
Colourbox pra sempre permanecerá pra poucos, mas os
leitores deste blog podem fazer parte dessa seleta minoria.
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