terça-feira, 19 de fevereiro de 2019

TELINHA QUENTE 348


Roberto Rillo Bíscaro

A Bélgica é pequenina e étnica/linguisticamente fragmentada. Seus 10 milhões e meio de habitantes vivem numa área de 30 mil quilômetros quadrados e falam flamengo, francês e alemão. Isso oficialmente, porque há dialetos e além disso, não há garantias de que todo mundo seja trilíngue.
Imagine isso pras estações de TV: podem produzir uma série em flamengo que não será assistida pela parte francofalante da população. Assim, as audiências são potencialmente pequenas e os orçamentos, por conseguinte, ínfimos. O preço dum capítulo de The Crown pode produzir uma temporada toda na sede da União Europeia.
E ainda assim, a Bélgica é considerada a bola da vez nos círculos hipsters. Canais como o Hulu, o Chanell 4 e o Sky Atlantic tem transmitido séries de lá, resenhadas em jornais, tipo Variety e The Guardian. Como este blog e seus leitores sempre fomos hispters, você já leu resenhas sobre Salamander, Cordon e Matrioshki. As 3 faladas em flamengo.
Chegou a vez duma produção da parte francófona da Bélgica. Ennemi Public (2016) foi produzida pelo canal La Une e comparada por operadoras anglo-americanas, onde recebeu o nome Public Enemy.
A diretora Indra Siera afirmou que pra se distinguir da montanha de séries estrangeiras, e também pra refletir a diversidade cultural de seu país, uma das características dos shows belgas é a não aderência a um subgênero. Séries de lá, tendem a ser meio “estranhas”, e isso tem captado a imaginação de audiências internacionais.
A dezena de capítulos de Ennemi Public não chega a ser esquisita, mas lhes falta foco. Há umas 3 histórias lutando por atenção – uma delas, um thriller policial ótimo – mas o resultado é apenas bom, porque nada é desenvolvido a pleno contento.
Depois de 2 décadas na cadeia, o pedófilo assassino Guy Béranger é solto em liberdade condicional pra iniciar seu noviciado numa abadia numa aldeia incrustada na floresta. A presença do serial killler provoca ira dentro e fora da abadia e cidadãos de bem provam não serem assim tão de bem. Especialmente, quando crianças começam a ser mortas na comunidade. Daí, chega uma policial de Bruxelas, que, de tão perturbada, vê e fala com a irmãzinha desaparecida (superapta ao trabalho, como sempre nessas séries). Também há uma família tradicional local que tem um projeto pruma cervejaria, um irmão marginal e outro monge, abade, whatever.
Como em toda série policial, esses fios se encontram, de modo até algo surpreendente, mas Bérarger começa muito enigmático pra no meio perder todo o destaque. O tal irmão religioso nem sabemos porque está ali, a não ser porque talvez seja galã belga, porque sua personagem não influi em nada.
A conclusão é que Ennemi Public satisfaria muito mais se tivesse metade dos capítulos, mas fosse o thriller policial competente sufocado pelo roteiro entulhado. Não seria história original, mas do jeito que está além de também não o ser, não deixa impressão duradoura.

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