Roberto Rillo Bíscaro
Em 1910, G. K. Chesterton criou detetive amador
antitético ao famoso Sherlock Holmes, de Conan Doyle. Ao contrário do frio
dedutivismo de seu colega muito mais famoso, Father Brown resolve tudo através
da intuição e inerente conhecimento da alma humana, obtido no confessionário.
Poucas adaptações das aventuras do padre católico na
anglicana Grã-Bretanha haviam sido feitas até que em 2013, a BBC deve ter se
surpreendido com o estouro de sua série vespertina. A emissora tencionava
revigorar suas tardes e conseguiu, ou pelo menos, o pessoal deve gravar
adoidado ou ver em streaming. Fato é que agora Father Brown é exibido em umas
duas centenas de territórios ao redor do globo. Algumas Netflixes têm várias ou
todas as sete temporadas. Assinantes brasileiros, chovam pedidos pra empresa,
porque é muito fofo demais da conta.
Os episódios são adoráveis e misturam discreto humor com
história de detetive. É tudo desavergonhadamente inverossímil. Na pequena
aldeia de Kembleford - que tem desde bares barra-pesada obscuros a seitas pagãs
secretas – e em incontáveis mansões agrárias, o rechonchudo, chapeludo e
guarda-chuvado pároco mete o nariz em tudo e resolve todos os crimes, pra
desespero dos inspetores locais, que vivem prendendo alguém erroneamente no meio
ido episódio.
Não há nada de novo na fórmula: é crime digestível
resolvido pela Miss Marple local (diversas vezes, é feita a comparação), por um
bando de gente irrealmente fofa. Tem lady que investiga junto com seu chofer;
sobrinha de lady sapequinha, mas nada esnobe e a fofoqueira adorável Mrs.
McCarthy. Ai que vontade de comer seus “award-winning
strawberry scones”!
Dos detetives injuriados com a perspicácia superior do
prelado, de longe o melhor é o Inspetor Mallory, mas você terá que esperar umas
3 temporadas. Jack Deam está perfeito com seu bigode postiço, suas consoantes
finais explodidas, assim como seus ‘gês’ finais do gerúndio.
Mark Williams é irrepreensível como Father Brown. Sua
entonação impossivelmente branda o tempo todo, sua capacidade irrestrita de
compreensão, simpatia e amor cativam. Ter visto as cinco primeiras temporadas
sem intervalo dos meses das férias televisivas deu pra perceber direitinho como
o ator torna as expressões faciais e os movimentos da personagem bastante
“forçados” pra realçar sua comicidade e charme simpático.
Totalmente viciante
cuti-cuti nóxa-nóxa.
As sacrossantas temporadas de Father Brown são verdadeiros
massacres: além das mortes das vítimas, que podem chegar a três em certos
episódios, as histórias se passam nos 50’s, quando a pena de morte vigorava no
Reino Unido, então, some aí os enforcamentos dos perpetradores e você terá um
banho de sangue.
Menos mortandade ocorre nos 43 episódios de Father
Dowling Mysteries, durante suas três temporadas, entre 1989-91. Como seu colega
inglês, o norte-americano também foi baseado numa personagem, no caso, do
escritor Ralph McInerny, que ainda tinha uma freira detetive.
O pianista Padre Dowling investiga sequestros e eventuais
mortes, em Chicago, o que implica a presença da máfia em diversos episódios. Ele
é auxiliado pela improvável Irmã Stephane, que, por ter sido criada na rua,
sabe arrombar portas, trapacear no pôquer e até pilotar avião. Há dois alívios
cômicos, que mais enchem do que divertem, especialmente o carreirista
egocêntrico Padre Prestwick. Dowling foi interpretado com simpatia pelo finado
Tom Bosley, que coadjuvara em Murder, She Wrote, como o xerife Amos Tupper, até
ganhar seu próprio show.
Father Dowling Mysteries
não apresenta nenhuma característica destoante da média das séries de detetives
amadores dos anos 70/80/90; é tudo fórmula. Com o tempo, simpatizamos com
Sister Stephanie e Dowling é superfofo, mas não dá pra recomendar em detrimento
de Father Brown, que deveria ser prioridade pra quem pretende se iniciar em
religiosos detetives.
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