Alguns grandes álbuns ficam para trás em qualquer
discografia, seja lá sobre onde falamos. Por motivos que não cabem especular
aqui, um cânone é estabelecido e repetido a ponto de dar a ideia de que em tal
período só se produziu X, Y e Z de “bom”, o resto não conta, e ainda fica coisa
que sequer é captada pelos radares.
No Brasil dos anos 1970, há artistas e álbuns que
merecidamente constarão em qualquer lista de melhores da década. Como negar a
importância de Clube da Esquina, Refazenda, Acabou Chorare ou Transa? Há
diversos trabalhos, porém, ainda nem tão difundidos quanto mereceriam. Um dos exemplos é o álbum homônimo do
“imorrível” Di Melo, lançado em 1975.
Roberto de Melo Santos, recifense migrado para São Paulo,
cantava na noite paulistana, quando Alaíde Costa apresentou-o a um executivo da
EMI-Odeon. Di Melo, o álbum, não deve ter tido suficiente divulgação e Di Melo,
o compositor/cantor, levou calote nos direitos autorais. Desgostoso, o soulman
ficou décadas sem gravar. Nos anos 90, DJs britânicos descobriram seu trabalho
e, por consequência, alguns brasileiros. Desde então, seu estatuto de
compositor de um dos grandes álbuns dos 70’s vem crescendo e Di Melo até voltou
a gravar.
O álbum homônimo de 1975 é pérola de doze faixas sem
deslize, do qual participaram nomes do porte de Hermeto Paschoal e Heraldo do
Monte. A parte medalhões como Tim Maia e Jorge Benjor (que então era
simplesmente Ben), não muitos outros influenciados pela black music constam do
panteão da MPB. Di Melo prioritariamente navegou nessas águas negras, mas seu
álbum de estreia também singrou outros mares.
Da dozena de faixas, metade é de extração soul,
extremamente bem tocadas e às vezes, com benvindas intromissões de elementos de
samba e até certa percussão makossa, em A vida Em Seus Métodos Diz Calma, um
dos deleites do álbum. É dessa parte que saem clássicos irrefutáveis, como a
estupendamente viciante Se O Mundo Acabasse em Mel e balanços impecáveis como
Kilário.
As denúncias sociais e letras sobre a desumanização
provocada pela metrópole estão acompanhadas por bandoneón tangueiro em
Conformópolis e em Sementes o ritmo argentino assume primazia. Joao é
samba-canção e Indecisão é espécie de moda violeira, com coro feminino fazendo
láiáláiá, bem ao modo dos anos 60 e 70. Alma Gêmea é balada meio folk, linda.
Sofisticado e divertido, Di
Melo, o álbum, não deve nada a seus contemporâneos sempre mais badalados e
reconhecidos.
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