Roberto Rillo Bíscaro
Hoje faremos dobradinha temática! O elo é o nome
internacional usado para divulgar essas duas séries: Undercover. Duas séries
policiais europeias, uma da Bulgária; outra belga. Uma ótima; outra, não. Uma
na Amazon; outra, na Netflix.
A Bulgária é um dos degraus mais baixos da UE. Com altas
taxas de emigração e corrupção, o ex-país comunista é cenário mais que adequado
pruma boa série de gangsteres. A Televisão Nacional da Bulgária produziu cinco
temporadas de dúzia de episódios cada, de Undercover (2011-16), ora no catálogo
brasuca da Amazon, em versão dublada.
Em seus sessenta episódios, Undercover mostra um policial
infiltrado na quadrilha mafiosa mais importante de Sofia, liderada pelo fã de
ópera Petar Tudzharov, o Dzaro. Aos poucos descobrimos que seu perseguidor
implacável, o Comissário Emil Popov, tem razões muito pessoais para odiá-lo.
Essa porosidade da fronteira entre o pessoal e o professional perpassa parte da
trama em todas as temporadas. Empregos na polícia viram obsessões pessoais. Há
horas que parece que os bandidos são mais profissionais, porque seguem seu
objetivo empreendedor que é basicamente, lucrar, como o de qualquer empresa.
Declaradamente inspirada pelo filme Os Infiltrados
(2006), de Martin Scorcese, Undercover deve muito também à obra de Quentin
Tarantino (aquela musiquinha com guitarra surf-rock é pura tarantinice) e a
séries como Sopranos (o Gancho é totalmente Frank Tagliano). Isso não desmerece
a produção, cujos roteiros supostamente baseados em casos policiais reais da
Bulgária, são absorventes, cheios de ação e só cansam um pouco na derradeira
temporada, devido a um par de escolhas questionáveis. Por que fazer aquilo por
tantos episódios com a personagem tão importante de Popov?
Undercover existe num universo eminentemente masculino,
que para padrões anglo-europeus e até de outros países, chega a ser
chauvinista. Mulheres são estúpidas dondocas, objetos pra prazer e violência e
intercambiáveis até na aparência. Na quinta temporada há desastrada tentativa
de regeneração. A policial-psicóloga é ridicularizada e hostilizada por seus
colegas da polícia, de modo inacreditável até pra nós latinos, tão machistas.
Ou, talvez, porque estejamos mais acostumados a ver produções de países onde
fazer esse tipo de representação despertaria fúrias tempestivas.
Quem teme por produção empobrecida por ser de país sem
tradição televisiva pra nós, engana-se. Ao longo das temporadas, há explosões,
perseguições, tudo muito bem feito. Undercover prende e tem final que você não
espera (não vi o filme de Scorcese, então não sei se foi inspirado por ele).
A Bélgica tem sido uma das queridinhas de telespectadores
um pouco mais alternativos, nesses últimos anos. O pequenino reino já
contribuiu duas séries bem legais para o catálogo da Netflix brasileira: Tabula Rasa e La Trêve. Esses programas foram produzidos por outras estações e
adquiridas pela Netflix, mas este ano a empresa estreou sua primeira produção
belgo-holandesa, Undercover, aqui batizada de Operação Ecstasy.
A província fronteiriça entre os dois nanicos e ricos
países europeus é a maior produtora mundial de ecstasy e outras drogas
sintéticas, uma espécie de Colômbia do primeiro mundo, com assassinatos ao ar
livre e suborno a granel.
Baseada em fatos, Undercover mostra um casal de policiais
infiltrando-se numa espécie de condomínio rural, onde vive o chefão do tráfico
local, com sua esposa e asseclas. A parte policial não poderia ser mais clichê:
a tensão é gerada pelas desconfianças às vezes suscitadas pelos parças do
narcotraficante e pelas saias-justas que o casal de tiras tem que passar.
A Undercover belga tenta adicionar ingredientes extras e
interessantes, como possível ligação entre o casal de policiais e o
desenvolvimento dum vínculo pra lá de afetuoso entre a policial e esposa do
traficante. Infelizmente, nada disso é aprofundado, então Undercover é mais do
mesmo, totalmente esquecível.
Acresce que dez capítulos foram demais. O miolo da série
tem problemas monumentais de ritmo. Há capítulos que dá tranquilamente pra
ficar no Zap o tempo todo e ainda entender, se bem que nem interessa muito,
anyway.
A Netflix deveria ter pegado
essa grana e comprado shows belgas já prontos e fantásticos, como 13 Comandments, Cordon e/ou The Out-Laws.
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