Rotular orienta o espectador no sentido de esperar o que
pode testemunhar e a quais convenções terá que aceitar, além de ser um dos
primeiros critérios pra decisão do que assistir. Se leio “drama esportivo” ou
“ação”, já me desmotivo um bom bocado pra dar chance ao material.
Por outro lado, tais classificações não dão conta de
descrever algumas séries, quando existe certa mistura de subgêneros ou quando
se está trafegando por um com fortes traços de outro(s). É o que ocorre com os
oito episódios de Craith (2018). Produzida pela galesa S4C, a série recebeu o
título Hidden pra distribuição internacional e um de seus criadores é Ed
Talfan, corresponsável por Hinterland (disponível na Netflix), melhor exemplo –
junto com Shetland – do Celtic Noir, aquele irmão-siamês do Nordic Noir.
Craith trata de investigação sobre garotas desaparecidas
no lindo, lúgubre e meio esquálido campo do País de Gales. Por isso, é
classificado como “crime drama”, embora isso seja muito redutor e decepcionará
quem gosta de agilidade narrativa, crimes altamente estilizados e pistas falsas
ou não. Craith é mais um drama psicológico sobre desajustamento, traumas
infantis tornados obsessões e vidas fracassadas ou se acabando.
Jamais atinge o esplendor
trágico deprê de Hinterland, mas é bom companheiro.
Ninguém tem dúvida de que Shetland é um dos dramas
policiais mais fascinantes e tristes da década. Se não tão influente, quanto
Broadchurch, a série da BBC sempre apresentou tramas sólidas, interpretadas à
perfeição, no cenário esplendorosamente cinza, frio e eólico do arquipélago escocês
(se bem que muito é filmado na própria Escócia).
A quinta temporada, exibida entre fevereiro e março,
eleva a angústia a nível social/global, porque a meia dúzia de capítulos trata
de drama pessoal advindo do flagelo macro do tráfico de pessoas. Quando shows
são cancelados por serem “brancos demais”, parece até coisa de cota racial:
vamos inserir personagens negras num ambiente totalmente viking, através do
tema X. Essa encarnação um pouquinho mais politizada (calma, não há [muito]
discurso em Shetland) e inédita na série, deve ter sido a causa de certo
titubeio no episódio de abertura. Mas, depois que acerta o passo, Shetland
volta a sua capacidade hipnótica, a qual nem Broadchurch teve.
DI Jimmy Perez, DS Tosh e turminha passam os seis
episódios buscando Zezi Ugara, nas mãos dos escravistas modernos. Como é
Shetland, não sabemos se ela sairá viva no final, porque essa série jamais se
preocupou em reorganizar a realidade ficcional em tons róseos após a
“resolução” dos casos. Na verdade, fãs da série, esperamos até que o fim seja
catastrófico. Na temporada passada, mal consegui levantar o controle-remoto pra
mudar de programa, de tão deprê e chapante o desfecho.
Douglas Henshall levou o BAFTA, em 2016, mas deveria
papar outro este ano se houvesse realmente justiça neste mundo. Uma das
subtramas dessa temporada envolve possível novo relacionamento pro detetive.
Quando ele recebe a notícia de que seu interesse romântico pode ser parte da
rede de traficantes, dá quase pra sentir o nó em seu estômago. Aliás, suas
encostadas em paredes são antológicas.
O bom dos finais que deixavam a gente mole até, é que
enquanto rolavam os créditos, a narradora da BBC se despedia nos confortando
que Shetland voltaria no ano seguinte. Nesta temporada, isso não ocorre e a BBC
ainda não renovou o show pra sexta temporada.
O final desta temporada
teve mesmo saborzinho de amarramento pralgumas personagens, mas gente como o DC
Sandy ficou no ar, se bem que ele nunca foi relevante como Perez ou Tosh. Desse
modo, não dá pra saber se há planos proutra temporada. Talvez seja melhor
assim, sair enquanto se está no topo. Esta quinta vinda já deu sinaizinhos um
pouco incipientes de que pode ser boa ideia pensar em parar. Mas, como devoto,
prefiro nem cogitar isso. Quero mais tristeza e mais OKs de Jimmy Perez.
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