sexta-feira, 30 de agosto de 2024

JUDOCA ALBINO EM PARIS

"Levo comigo essa força do nosso Estado de se superar", afirma atleta caxiense que estará nos Jogos Paralímpicos de Paris

Judoca Marcelo Casanova já está na França para a sua primeira Paralimpíada. Atleta do Recreio da Juventude falou sobre a expectativa dos Jogos de Paris


Ele escolheu viver e não se lamentar. Marcelo Adriano Azevedo Casanova vai completar 21 anos no próximo dia 1º de setembro. O aniversário não será comemorado em Caxias do Sul. O destino lhe reservou celebrar a data em Paris, nos Jogos Paralímpicos 2024.


O judoca vai cantar parabéns com os colegas da seleção brasileira. O maior presente pode vir alguns dias depois, em 7 de setembro, data em que se comemora a Independência do Brasil, quando ele entrará no tatame na disputa por medalha.


— Para mim é uma sensação muito gratificante de todo o trabalho que foi feito, de representar o Brasil, representar o Rio Grande do Sul, Caxias do Sul, o clube Recreio da Juventude também, que sempre me apoiou. É uma honra muito grande e, se Deus quiser, eu vou conseguir representar bem e trazer essa medalha para nós. Para mim é o ápice de toda uma carreira — declarou Marcelo Casanova em entrevista ao programa Show dos Esportes, da Rádio Gaúcha Serra.


Com albinismo e 6,75 graus de astigmatismo, Marcelo escolheu tirar as pedras do seu caminho e soube lidar com os espinhos do labirinto da vida até chegar ao seu sonho. O Marcelo que chega a Paris é outro se comparado com aquele que entrou no esporte por brincadeira.


— Esse ciclo foi de muito aprendizado para mim. Eu comecei lá em 2021 ainda, porque eu fiz a migração do esporte convencional para o paralímpico. Foi um baque muito grande na diferença das regras. Será um Casanova mais amadurecido que vai lutar nessas Paralimpíadas, com um repertório maior e com uma condição de ser medalhista muito maior — comentou o judoca, que tenta lidar com um adversário invisível antes da competição, a ansiedade:


— Agora a ansiedade está a 100 mil. Toda hora pensando na competição, pensando na luta. Estamos treinando, estudando os adversários. Então, a cada dia que passa eu vou ficando com o friozinho na barriga bom.

PRECONCEITO, PSICOLÓGICO E RS


Judoca do Recreio da Juventude, Marcelo Casanova fez a transição para o Judô Paralímpico em 2021, entrando no circuito internacional, em 2022, no Grand Prix da Federação Internacional de Esportes para Cegos (IBSA). Atleta no meio-pesado (-90kg) da classe J2, com percepção e definição de imagens, Casanova teve de aprender a lutar contra o preconceito e os olhares diferentes no começo.


— Preconceito sempre existe, mas é mais um estranhamento de quem não conhece. Eu tenho essa deficiência, tenho que chegar mais perto para ler, tenho que forçar o olho. Até por conta do albinismo tenho essa pele mais branca, cabelo branco, então existe um estranhamento da sociedade, mas foi uma coisa que nunca me abalou. Quando era criança tem aquele bullying, mas a gente passa por cima — revelou.


Dentro da sua categoria, Marcelo é quarto colocado no ranking mundial, o que lhe garantiu a posição de cabeça-de-chave em Paris. Assim ele foge dos três primeiros do mundo na estreia.


— Todos que vão estar lá eu já lutei em algum momento nesse ciclo. Quem chega ali na Paralimpíada tem a mesma chance. Tem o francês, o georgiano, o rapaz do Uzbequistão também, que são muito fortes. Mas eu acredito que quem vai despontar nessa competição sou eu. Acredito que eu consiga chegar lá, surpreender — avaliou.


Marcelo transparece confiança. Ele sabe o quanto o psicológico é importante. Outro fator que o motiva é levar a bandeira do Rio Grande do Sul. Na enchente de maio, ele precisou ser resgatado de barco de um hotel em Porto Alegre antes do embarque para a Geórgia, onde foi bronze na terceira etapa do ano no Grand Prix da Federação Internacional de Esportes Para Cegos (IBSA).


— O psicológico é tão importante quanto a parte física e técnica. Na enchente não tive prejuízos maiores, se não esse perrengue que eu passei, mas eu levo comigo essa força do nosso Estado de se superar, de se reerguer. Tento representar essas pessoas que sofreram muito com essa enchente — recordou o judoca.

FAMÍLIA E ESPORTE
A família de Marcelo Casanova viajou para França para acompanhar o judoca nos Jogos.Arquivo pessoal / Divulgação


Marcelo reconhece que o esporte serviu como vetor para o seu desenvolvimento. Dentro do tatame, nunca se sentiu inferior. Ele sempre acreditou no seu potencial. E a limitação foi subjetiva.


— A limitação sempre foi uma palavra, eu nunca me senti assim, de não poder fazer isso. No esporte eu acho que ganhei muita confiança, de não ter vergonha de ter o cabelo branco, de andar na rua, de não enxergar algumas coisas. Me deu muita confiança para ser quem eu sou hoje e amadurecer — contou.


O judô entrou em sua vida por influência do pai, que lhe apresentou o esporte nas Olimpíadas de Londres. Ele até tentou outros esportes, como basquete, futsal, handebol e capoeira. Entretanto, com esportes com bola ele admite ser um pouco desengonçado.


— Era uma criança fortinha, gordinha, já tinha uma forcinha diferente, comecei a gostar, a competir. No início tomei muita porrada, como todo mundo. Mas eu gostava de competir e, eventualmente, ganhava uma medalhinha. O meu irmão veio logo na sequência para o judô também. Começou a competir e, um ano depois, o meu pai entrou. A gente tinha essa rivalidade interna em casa — destacou.


A família já está toda em Paris. O pai Antônio, a mãe Ângela e os irmãos Rafael e Marco estarão nas arquibancadas. Rafael Casanova embarcou confiante no irmão. E para os pais, o orgulho do filho saltam aos olhos.


— Geralmente a gente sente as coisas meio parecido, meio que uma simbiose quase, mas os nossos pais, eu percebo que há um orgulho muito grande, dá para ver o brilho nos olhos deles. Então, que nem a minha mãe falou esses dias, o fato de ele estar chegando onde ele chegou, já é um título muito grande — afirmou o irmão.

FICHA TÉCNICA

MARCELO ADRIANO DE AZEVEDO CASANOVA
Nascimento: 01/09/2003
Natural: Caxias do Sul
Residente: Caxias do Sul
Esporte: Judô
Ranking Mundial: 4º lugar
Clube: Recreio da Juventude
Classe: Meio-pesado (-90kg) da classe J2
Medalhas:


🥇 Jogos Parapan-Americanos - Santiago-CHI 2023


🥇 Parapan-Americano de Judô - Edmonton-CAN 2022


🥇 Parapan-Americano de Jovens Bogotá-COL 2023


🥈 GP da IBSA - Etapa de Almada-POR 2023


🥉 Jogos Mundiais da IBSA - Birminghan-ING 2023


🥉 GP da IBSA - Etapa de Tblisi-GEO 2024
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